A realidade ultrapassou todas as expectativas. Obrigada.
terça-feira, julho 31, 2007
segunda-feira, julho 30, 2007
Sono profundo
Esta noite voltaste, como tens feito tantas vezes nos últimos tempos. Como fizeste tantas vezes que já se tornou um hábito. Tinhas uma casa que era também minha, uma mulher que não conhecia, um filho que parecia ser teu. E tinhas-me a mim, como escolha principal, para lá da mulher e da criança que já faziam parte da tua vida. Eu entrava na tua casa - que já fora minha - e explorava os teus móveis, a tua decoração, o teu espaço, tudo o que fizeste de novo e que eu há muito não vejo. Nem voltarei a ver.
Porém, no meu sono profundo, tudo fazes para aparecer, para me levar, para me conduzir até ti. Pedes-me desculpa por tudo e tentas corrigir, com um beijo, todos os males que já fizeste. Eu, tola, perdoo tudo e lá entro na tua casa, cumprimento a tua mulher e passo a mão na cabeça do teu filho. Durmo depois na tua cama, escondida, para que só tu saibas que quem lá está sou eu.
Entras na minha cama comigo, todas as noites. Antes de adormecer afasto-te do meu pensamento e recordo outras coisas, outras pessoas, outras realidades que me são mais favoráveis. Mas é quando fecho os olhos que apareces em força: atacas-me o subconsciente como se o conhecesses bem demais. E conheces... ainda conheces. Aperto a mão do homem que agora fica comigo e é com ele que quero passar a noite. Não o deixas ficar sozinho e vens. Entras de rompante como é teu apanágio e sentas-te à cebeceira talvez a rir. Vês que é outro que abraço, mas sabes que, apesar de tudo, é a ti que quero abraçar.
Acordo com a cabeça pesada, mais uma enxaqueca e os olhos que se fecham perante a manhã. Talvez tenhas dsaído a meio da noite para deixar entrar outros sonhos, mas é o teu que me dá os bons-dias. Esfrego os olhos cansada e vem-me à memória toda a noite que passámos juntos. Quero negá-la, afastá-la de mim, mas ela teima em deitar-se ao meu lado.
Vens nos meus sonhos para abalar o mais profundo dos meus sonhos. Preferia que fizesses como tantas vezes em que me deixaste acordada, à tua espera... preferia que não viesses. Porque já não preciso de ti.
Livros III (ainda vou a tempo?)
"Estação das chuvas", José Eduardo Agualusa
"Travels with Herodotus", Ryszard Kapuscinski
No prelo:
"Território Comanche", Arturo Pérez-Reverte
"50 grandes discurso da história", selecção e apresentação Manuel Robalo Miguel Mata
Na lista de compras:
"All things fall apart", Chinua Achebe
"Entrevista com a História", Oriana Fallaci
domingo, julho 29, 2007
Agora para coisas mais comezinhas [ii]
sábado, julho 28, 2007
Apaixonada
Estás apaixonada por quem também está apaixonado por ti. No teu caso, um feito: habituada a gostar de homens que nada valem, habituada a paixões com quem não te pode garantir nada (quem não quer), costumeira em relações impossíveis, com fim à vista, escondidas. Eis que te apaixonas por quem gosta de ti! Eis que surge a pessoa certa (para este momento, pelo menos) que te encanta com um beijo que todos podem ver, que te dá a mão num lugar onde se amontoam pessoas, que assume contigo uma relação que não pode ser escondida. Porque existe, porque é bonita, porque é recíproca.
Não há noites loucas que superem isto; não há mentiras e telefonemas sussurados mais valiosos que este namoro; não há relação de pé ante pé que seja mais importante que esta. Porque o amor fez-se para ser partilhado. Entre dois, e com os outros. Às escondidas, só dos pais quando somos mais novos. Na idade adulta, nada nos pode impedir de dizer: é de ti que eu gosto.
A tua voz treme com o teu riso. Imagino os teus olhos azuis muito abertos e um cigarro a fumegar devagar, para fazer de conta que não tens que enfrentar esta nova situação. Em breve estarei aí, junto de ti, para o conhecer, para te dizer 'sim, aposta, vai em frente', como se a minha opinião contasse, como se valesse de alguma coisa tudo o que possa dizer-te. Para ti vale, porque estás insegura. Não sabes muito bem o que é ser gostada, amarrada, apaixonada. Tudo isto à luz do dia.
Combinas encontros e fins-de-semana. Passas noites em claro para que todos vejam. Almoças e jantas, fazes uma vida normal. E estranhas. Estás agora mais feliz do que alguma vez te vi (ouvi). Mesmo receosa sinto o seu sorriso aberto e uma despreocupação com tudo o resto. Ultimamente nem te queixas do excesso de trabalho, das crises com a tua chefe, de um ou outro problema com a tua mãe. Só conta o novo namorado, o rapaz por quem te apaixonaste e que antes se apaixonou por ti. E essa sensação, a que sentes agora, é única.
O medo passará com o tempo. Talvez não por completo porque, no amor, especialmente no início, receamos sempre perder aqueles momentos bons, aquela sensação de paz, de respirar fundo e fazer bater o coração mais depressa. Mas esse é um medo bom. Não magoa. E verás que vai ser melhor assim: todos vão saber que estás apaixonada. E que desta vez, vale a pena!
sexta-feira, julho 27, 2007
O trauma da mini-saia
Há coisa de dez anos, quando comecei nesta vida de jornaleira, fui entrevistar a primeira mulher cadete da força aérea. Se não era isto, era qualquer coisa do género. O que interessa é que foi numa base aérea. Cheia de homens. E eu com uma mini-saia de pouco mais do que 20 centímetros. O caderno de apontamentos cuidadosamente colocada atrás das costas, ali na linha da saia, a tentar tapar qualquer coisa, enquanto subia escadas.
Hoje fui entrevistar um ministro. Coisa de última hora. Perguntas engendradas em 20 minutos para substituir um colega. A conversa foi num estaleiro de obras. E a mini-saia [vestido branco em versão trapézio] estava muito [mesmo muito] acima dos joelhos…
Primeiro Amor
A questão é pertinente e muitas vezes penso nela. Pergunto-me se é possível amar duas vezes, se é possível amar como da primeira vez. Pergunto-me se depois da primeira vez é mesmo amor ou se é apenas um gostar forte, uma paixão, um comodismo, uma vontade.
O primeiro amor deixa marcas para sempre. Se for mesmo amor. Eu não acredito em relações de meses, paixões assolapadas que acabam como começam, uniões ocasionais com sentimentos à mistura. Acredito em relações fortes, em sentimentos que não controlamos, no amor crú que nos impede de falar, de raciocinar, de saber estar. Não misturo o amor com paixão. O amor segue-se à paixão e cola-se à pele sem dela querer sair. E quando o queremos arrancar ele lá está... eventualmente, para sempre.
O segredo será aprender a viver com ele, com o primeiro amor que se nos cola ao corpo? Ou o novo amor, a nova relação, a nova união transforma esse primeiro sentimento numa sensação mais serena, mais capaz, melhor? Não sei...
O primeiro amor é infantil, ingénuo, colhe-nos a alma e circuncreve-nos os reflexos. O pensamento retrai-se e fica apenas um batimento acelerado, desprotegido, tão bom que chega a saciar. Quando acaba é arrasador, destrutivo, decepcionante. Mas acabará, de facto? Ou será que vivemos para sempre com ele? Poderá alguém livrar-nos de um primeiro amor?
Crescemos com ele, habituamo-nos a ele, vestimos-lhe a cor. O primeiro amor é assim como uma borboleta que nos poisa no braço e ficamos quietos com medo que fuja, não queremos assustá-la... Então, ela bate as asas devagar e prende-nos a respiração. Observamos-lhe a beleza e fixamos nela os nossos olhos para nunca mais a esquecermos. O primeiro amor voa quando mexemos o braço. Às vezes volta. Mas muitas vezes segue para longe e deixa-nos apenas o cheiro, a memória, o vazio.
Talvez não possamos viver agarrados a ele. Talvez não seja bom para nós tê-lo como exemplo para amores futuros, relações presentes. Talvez o primeiro amor seja apenas uma experiência para outros, uma forma de sabermos o que não podemos repetir, uma maneira de aprendermos a lidar connosco próprios. Ou talvez não seja nada disto. Talvez o primeiro amor seja eterno, talvez seja a base para tudo o resto, talvez se sente à nossa direita observando os amores que então passam...
Haverá amor como o primeiro? Eu não sei...
É capaz de ter razão
Descobrir todos os dias motivos suficientes para não deixar o outro - uma facilidade obrigatória - é uma tarefa que faz de Sade um menino de coro. Dor e recompensa, o abandono sempre no horizonte, dá uma tesão insuportável."
Agora para coisas mais comezinhas
Porque é Verão
As pessoas olham ao som de uma gargalhada uns decibéis acima do recomendado. Vou sozinha. Telemóvel na mão.’O prolongamento do teu braço’. A gargalhada transformada em sorriso que vem do mais fundo da alma. A resposta segue na volta do ‘correio’. A parada sobe. Tal como as expectativas. De parte a parte. Ou talvez não. Talvez seja apenas eu. Nesta descoberta lenta de um mundo novo. No meio do ram-ram do trabalho. No surrealismo em formato diário. Na esquizofrenia generalizada. No meio de tudo isto antevêem-se dias lânguidos e noites quentes. Boas. Por muito curtas que sejam. Porque é Verão.
quinta-feira, julho 26, 2007
Ora Pimba, Pimba
A minha adolescência foi passada nestas festas de Verão, algures no concelho de Pampilhosa da Serra, o mais pobre de Portugal. Foi lá que vi cantar a Tonicha e a Lena d'Água, o Trio Odemira e o Marco Paulo. Foi nessas festas de aldeia que bebi o meu primeiro Porto, que experimentei a minha primeira cerveja, que dei o meu primeiro beijo. Foi por causa das festas que pedi aos meus avós para me deixarem sair à noite, que saltei o muro para fugir, que acordei tarde no dia seguinte. Guardo boas recordações desses dias...
Eu tinha um namoro certo nas férias de Verão, mas a maioria das minhas amigas, não. As festas eram por isso um belo sítio para arranjar casos e namoricos, beijinhos escondidos atrás da Igreja, risinhos envergonhados no intervalo das músicas. Éramos muitos, nessa altura: uns 20, às vezes mais, que nos juntávamos aos mais velhos para ter boleia. Lá nos enfiavam numa carrinha. alguns na parte de trás, poucos bem sentados, não importava... só queríamos chegar e a confusão no carro até servia para dar embalo à noite de festa.
Nunca me embebedei nessas festas. Era a certinha do grupo. Mas a cerveja regava toda a gente e poucos regressavam a casa sem cambalear. O meu namoro de férias (com que cheguei a casar, passados quase 20 anos) era um desses rapazes cheios de energia e com gosto pela fresquinha. Para me roubar uns beijos procurava acalmar-se e controlava o gosto. Bebia então sumos e coca-cola e passávamos o resto da noite em conversa melada. Sempre embalados pelo tom de festa.
No dia seguinte custava um bocadinho acordar. As noites só terminavam lá para as quatro, cinco da manhã - para mim, que tinha de estar em casa 'cedo' - e havia ainda as idas ao Relveiro, um sítio magnífico a uns quantos metros das casas da aldeia, com vista para o vale e um ventinho clássico que, mesmo nas noites frias, nos encantava para ver o céu estrelado. Se há um sítio no mundo perfeito para ver estrelas, esse sítio é o Relveiro. Mas, dizia eu, o que custava era acordar. Para depois almoçar e lá nos encontrávamos todos para falar da noite anterior.
Posta a conversa em dia e feita a digestão, seguíamos para o rio para o acordar final. É que à noite, havia outra festarola, noutro lugar, com outras atracções. Na terra também organizávamos a nossa festa. Mas o dinheiro da colectividade (lindo, não é?) era pouco e não pagava mais que um acordeonista ou uma banda mixuruca. Ainda assim lá estávamos, escondidos na Escola Primária, beijinhos e cigarros acesos às escondidas (a certinha não fumava), um passeio até ao largo para dançar com o povo, e o regresso ao esconderijo porque de noite todos os gatos são pardos.
Uma vez fizemos uma quermesse. Enrolei umas quantas rifas nos papelinhos às cores. Para dar, todas as pirosises possíveis, ofertas de fulano e sicrano, compras na loja dos 300 (que na altura não havia euros). E as velhinhas apaixonadas pelas porcelanas, as crianças pelos peluches, os homens pelas garrafas de whisky... Lembro-me que deu um bom lucro.
Mas toda esta história, para vos falar de uma festa imperdível, este ano, em Ponte de Lima. É de 10 a 12 de Agosto e no cartaz, vejam bem, há nomes como o de Tony Carreira, de Ruth Marlene, de Mónica Sintra. Isto, no primeiro dia. Ao segundo, sobem ao palco o Mickael (filho) Carreira, o José Alberto Reis e a Romana. E, a fechar, dia 12, cantam Emanuel, Ana Malhoa e Toy. Preço dos bilhetes? Quase nada: um dia são 10 euros, e pagam-se 20 euros pelos três dias! Imperdível, não é? Não me venham dizer que Agosto é um mês morto e que o Algarve é que é bom no Verão. Eu sempre andei pelo Norte, nesta altura do ano, e só tenho pena de estar numa ilha nos dias destas actuações.
Mais Pimba era difícil...
Regresso ao divã V
Lá em cima o cumprimento de sempre: aquele aperto de mão mole do doutor, aquela mania de não agarrar a mão dela, talvez por prurido, talvez por hábito, talvez cansado de apertar tantas mãos, tantas dores, tantas almas cansadas.
Deitou-se e não proferiu palavra. Ele esperou. Esperava sempre; quando muito lançava um 'Então', mas mais nada, esperava que ela falasse... Mais uma vez, pensou nos 60 euros da consulta e no tempo que passava depressa.
- O meu pai não gosta do meu novo namorado.
- Então porquê?
- Acha que ele é indeciso, que não me levará a lado nenhum. Acha que será uma experiência frustrante.
- E você, o que acha?
- Acho que em parte o meu pai tem razão...
Desfiou então as dúvidas que não a deixavam dormir, que lhe assaltavam a noite transformadas em pesadelos. Ela gostava dele, sentia-se bem com ele. Ele tratava-a bem, como uma princesa. mas não chegava. Nem para ela, nem para o pai. Ela queria casar, queria ter filhos, já tinha passado os 30 e sentia-se atrasada no tempo, sentia os dias a passarem por ela, a idade a correr com pressa. Ele tinha 40. Mas estava expectante, apaixonado, mas sem pressa. Nunca agarrava a conversa do casal, muito menos a dos filhos, e sobre uma casa conjunta, nem pensar.
Falou durante 40 minutos. Pés cruzados no divã, cabeça sobre a almofada forrada a lenço de papel, aquele cheiro da sala fechada e, lá em baixo, o movimento da hora de ponta no centro da cidade. Trocou a posição dos pés duas ou três vezes e olhou para o relógio de soslaio - não gostava de ultrapassar o tempo da consulta por causa do doente seguinte, um homem magro que lhe sorria sentado à porta - mexia as mãos com avidez enquanto falava e dele, do doutor, nem uma palavra. Ouvia apenas o hum de concordância, pressentia um abanar de cabeça compreensivo, adivinhava um escrevinhar na mente que o doutor tinha boa memória.
- E o que pensa fazer com o seu namorado?
- Nada.
- Nada?
- Nada. O que devo eu fazer?
Silêncio. Cravou os olhos na parede branca, à sua frente.
- Resta-me esperar não é? É como se estivesse numa consulta consigo: eu falo sobre determinados assuntos e mais não consigo que uns huns de concordância, uns acenos de cabeça, um olhar de atenção. Então, falo mais e exponho as minhas dúvidas. Nem olho para ele para continuar a fazer de conta que estou aqui. E ganho coragem para expor mais, para dizer tudo, para falar de mim...
- O seu namorado não lhe dá conselhos, pois não? - Não. - Não a pressiona, não a quer convencer de nada. - Não. - O seu namorado quer apenas tempo.
- E quanto tempo devo aguentar a espera? É que estou a envelhecer... o meu pai tem razão.
- Talvez o seu pai pudesse fazer o mesmo que o seu namorado...
- Calar-se?
Nova pausa.
- Talvez o seu pai não gostasse que o seu namorado se apressasse. Talvez valha a pena esperar. E saberá sempre até quando esperar. É como se uma porta há muito fechada acabasse por abrir-se porque alguém encontrou a chave certa para a fechadura.
O relógio dobrou o último minuto dos 45. Estava terminada a consulta. Depois de mais um aperto de mão sem garra sorriu para o doente seguinte e ficou à espera do elevador. Esperou que ele parasse noutros andares até chegar a ela. O botão vermelho dizia que ele viria, que subiria. Não voltou a pressioná-lo.
Quando chegou o elevador abriu a porta.
Aimee Mann
Para quem não sabe, esta senhora é autora da banda sonora do filme Magnólia, aquele dos sapos a cair do céu, com um Tom Cruise de barba grande. Um filme notável, na minha opinião. E a banda sonora é genial: tenho o disco. Esta noite recordei cada momento mas de uma forma ainda mais envolvente. A voz de Aimee é assim dengosa e solta, grave e sem vergonha para afinar nos agudos.
E o público estava encantado: Aimee voltou ao palco para dois bis e ainda nos surpreendeu com quatro canções, a última das quais apenas acompanhada à viola tocada pela própria. Aliás, ela tocou todas as músicas, marcando sempre aquele ritmo de cadência com as seis cordas do instrumento. Um aplauso também para o pianista: sem mácula - e para o teclista, cujos cabelos mais faziam parecer um elemento dos Mettalica, mas com uma energia e um à vontade surpreendentes para este tipo de música.
Um belo concerto. Obrigada pelo convite S.
Livros II
- Breve História do Saber, Charles van Doren, ASA Editores
- The Gun Seller, Hugh Laurie, Arrow Books
Conto ler a seguir:
- Rosa Brava e outras Histórias, Pedro Coelho, Oficina do Livro
- A Guerra do Mundo, Niail Fergurson, Civilização Editora
quarta-feira, julho 25, 2007
Livros
O Miguel pediu ou desafiou ou acha que não temos mais nada para fazer. Eu, como gosto do Miguel, ou melhor, como gosto muito dos blogs do Miguel. Respondo:
Três homens num barco, Jerome K. Jerome, Biblioteca de Editores Independentes
A procura do Amor, Nancy Mitford, Livros da Raposa
50 anos de crimes, Fernando Molica (Org), Coleção Jornalismo Investigativo, Editora Record e Abraji
Anna Karenina, Leon Tolstoy, Relógio D’Água
terça-feira, julho 24, 2007
Akon
Chegou de camisa azul e pullover sem mangas, aos losangos. Negro, sorriso branco, Akon sentou-se na cadeira do lado esquerdo, ao pé de Boss AC. Eu ia entrevistar os dois. Num hotel de Londres, um quarto com cama feita e um candeeiro a separá-los.
Eu tinha ouvido Akon nos Prémios MTV, há dois anos. Mas o Hip Hop não me diz muito e por isso deixei-o passar. Não dei importância... até sábado. Akon não terá ainda 30 anos mas já tem uma boa experiência de vida. Preso por roubar automóveis, converteu-se à música e a uma vida honesta por causa dela. Esqueceu os tempos de prisão e tornou-se um modelo para os jovens senegaleses, de onde é natural.
Gosta de mulheres e de bebida. Em Portugal - onde veio cinco vezes, no ano passado - conhece bem uma casa de striptease... e pouco mais, apesar de falar da linda paisagem do País... As letras que escreve chegam a ser pornográficas, mas ele diz que não, que falam de assuntos de homens mas que a pornografia é física. Mesmo quando escreve 'gosto muito do teu rabo' ou outras pérolas do género Akon acha que está a ser natural. Naturalmente, um homem. 'Se queremos dizer a uma mulher vem tomar um café, na verdade estamos a dizer-lhe: I wanna fuck you' disse-me Boss AC na entrevista. Akon riu às gargalhadas e concordou.
Mas o que me supreendeu neste homem não foi tanto o que ele disse, mas o que ele fez. Estava cheio o Appolo Theatre, em Londres. Cheio de pessoas de todas as idades, brancos e negros, homens e mulheres. Quando Akon entrou em palco foi a euforia: todos se levantaram e ergueram os braços para imediatamente a seguir começarem a cantar as suas músicas de cor. Akon sabe como motivar o público e tem um DJ brilhante: não me lembro do nome dele, mas jamais esquecerei a figura - ténis brancos com atacadores verde-alface; kilt; cabelo apenas no meio da cabeça e todo no ar, e uma energia contagiante, uma presença de palco melhor que a de muitos artistas em nome próprio.
O público aderiu e até eu tive de por-me em pé para ver o palco. Não cheguei ao ponto de aplaudir porque estava ali numa espécie de análise sociológica, mas pude sentir as vibrações da plateia, especialmente do público feminino, quando Akon tirou a t-shirt! E a rapariga - uma típica adolescente britânica, gordinha e vestidda sem gosto - que ele levou para o palco abraçou-o com mais força do que abraçaria a mãe se a reencontrasse passados 10 anos de separação. Fiquei entre o chocada e o rendida à figura.
De facto, as estrelas da música carregam os sentimentos e as emoções de quem as segue. Eu prefiro não seguir nenhuma muito de perto... Antes ver-lhes o brilho assim ao longe, do que deixar ofuscar-me por elas. Mas cada um fará como entender... Valeu a experiência.
Leão
O Leão, de um blog vizinho, é meu irmão. E ser irmão da Samantha não é fácil. Sobretudo nos últimos anos... Mas o Leão tem estado sempre à altura. Quando foi preciso, lá estavam os telefonemas diários, um pela manhã, outro pelo fim do dia, sempre a par dos problemas e mazelas de uma Samatha em perigo. Bom ouvinte, o Leão está sempre do lado dos felizes e bem-dispostos. Raramente mostra preocupações próprias, mas preocupa-se sempre com as questões que afectam os outros. O Leão sorri e escuta. Sorri e escuta.
É ponderado e tem orgulho naquilo que faz. Isso faz dele uma pessoa segura e autoconfiante. Não importa se está no jardim a podar a sebe, se vai de bicicleta até ao clube de golfe, se está na empresa de fato e gravata ou se tem reuniões por todo o País... em qualquer situação o Leão sabe estar. E sabe o que quer.
O Leão tem sorte. Ou sabe tê-la. Tem uma família fantástica (e não falo de mim), uma casa maravilhosa, carro da empresa - boa marca - tempo para tudo. Essa capacidade de ter tempo para tudo é das que mais me surpreende: ainda hoje, estava eu no pequeno-almoço, já ele tinha ido a Leiria e voltado!!! Acorda cedo e deita-se a horas decentes. Durante o dia arranja espaço para trabalhar, para estar com a família, para ler e ouvir música, para escrever no blog. O Leão é capaz de fazer isto tudo e ainda consegue fazer uns telefonemas aos amigos, combina umas almoçaradas e vê mais um episódio da série preferida. Invejo-o por isso.
Não há dúvidas que tenho sorte em tê-lo como irmão. É um bom ouvinte - já o disse - mas também um bom conselheiro, um bom amigo, um excelente companheiro. O Leão merece as qualidades que tem, e a capacidade para partilhá-las. O Leão merece estes 39 anos gozados a cada minuto. E faremos a festa quando chegarem os 40.
Parabéns Leão.
E obrigada!
segunda-feira, julho 23, 2007
Boa semana
Porque mereço.
sexta-feira, julho 20, 2007
Este blog desapareceu?
Eu sei que deveria "postar" mais. Estou a tentar emendar-me e até já consegui recuperar a minha password de acesso. Mas, aparentemente ausente, estou sempre à espreita.
Mas já lá vão mais de 10 dedos da mão em sustos. Pelo menos, uma vez por semana (é favor não tirar ilações acerca desta periodicidade), surge o sobressalto. "O blog desapareceu???"
O problema (claro!) não é meu. É que isto da maiscidadequesexo troca-me as voltas. Se clicarem na imagem facilmente percebem porquê :)
quarta-feira, julho 18, 2007
Estamos entendidos
A angústia não a deixou dormir, e muito menos o barulho da caixa mágica, na sala, para lá das paredes do quarto. Ele mudava de canal à medida que os olhos dela abriam e fechavam quase soluçando entre os lençóis. Conteve-se. Saiu da cama e foi sentar-se à frente dele, enfrentá-lo.
- Tens de decidir o que queres de mim. Eu tenho de saber o que queres de mim. Não podemos continuar nesta vida de namorados a viver em casas separadas, com umas noites juntos pelo meio, sem saber o que será desta relação amanhã.
Ele fixou os olhos no televisor mas estava a ouvi-la. Não disse nada.
- Não dizes nada?
- Eu não gosto de falar.
Ela não se exaltou. Acalmou-se e quis entender a postura daquele que prefere calar-se. Ela era impetuosa e não conseguia guardar mágoas para si. Estava perante uma pessoa diferente. Resolveu expor calmamente os seus argumentos. Ele desviava o olhar da televisão. Estava, de facto, a ouvi-la. Disse-lhe o quanto gostava dele, a dificuldade que tinha em compreendê-lo, disse-lhe que era mais fácil se tivessem projectos, se ela os conhecesse, mesmo que não fossem para amanhã. Terminou com um beijo de boa-noite e foi para a cama.
Daí a pouco, ainda sem dormir, ouviu-o chamar pelo seu nome.
- Não queres vir ver o que está a dar na televisão?
Juntou-se a ele. Era a melhor forma de fazê-lo feliz. Entendeu-o, naquela noite em que ele quis partilhar com ela um pedaço da vida. Era um simples episódio de uma qualquer série de televisão.
Mas quando se deitaram, fizeram-no juntos.
E se...
E se o querer menos for afinal querer mais. Se um não for um sim.E se em vez do fim quiser o sempre?
terça-feira, julho 17, 2007
Cartas de Amor
Quem as não tem?
As mais antigas têm anos e a letra ainda por formar diz-me que quem as escreveu ainda não tinha definido a caligrafia. Não têm rasuras mas escritas a azul parecem ter, nas palavras, um profundo sentimento de saudade, de alegria, de carinho. Vêm em papel pautado, tamanho A4, folhas arrancadas de um caderno escolar. Dias interrompidos para escrever. Talvez entre duas aulas, talvez enquanto fala o professor mais chato. E dão a volta para o outro lado da folha, terminam quase na última linha como se muito mais houvesse para dizer.
Outras há escritas mais tarde, pela mesma pessoa. As mesmas folhas A4 mas agora com o logotipo da empresa. Tarde com intervalo para escrever tantas linhas que me caíram no coração. E me fizeram sorrir. São promessas, perguntas, são desejos, vontades. Cartas de Amor escritas de forma apaixonada e verdadeira. Porque ninguém escreve sem sentir o que está a fazer.
E as mais recentes têm novo remetente. Adulto, pausado, consciente. São cartas de Amor sem a paixão de outros tempos, sem o gozo da juventude quase infantil. Mas trazem a responsabilidade e o carinho de quem cresce a gostar do outro. São poemas e linhas certas, escritas com a alma, com a mão segura, sem hesitações. Fico a pensar que gosto de lê-las, a todas, de recordá-las, de saboreá-las.
São tão poucas as cartas de amor dos nossos dias. O sms e o messenger vieram substituir essa caligrafia apurada, cuidada, letra a letra para fazer sentido num pedaço de papel dobrado em quatro. Sem precisar de envelope... Como podem as gerações de agora não ter uma carta de amor? Como guardam memórias e recordações? Deixam as mensagens escritas por alguns dias, mas logo a máquina pede mais espaço e são apagadas as palavras de amor. E vêm com abreviaturas, obrigam a adivinhar, perde-se tempo na procura da palavra, perdendo-se-lhe o sentido.
As Cartas de Amor não devem morrer. Um destes dias vou escrever uma. Para que fique para sempre.
domingo, julho 15, 2007
S.P.M. (ou quando é que será que me vais entender?)
- Deixa 'tar que o período já aparece e depois já te sentes melhor.
- E isso é suposto consolar-me?
...é só desta vez...

sábado, julho 14, 2007
Tróia na sexta-feira 13
Chegada à praia pelo corredor de madeira. Bola nos pés e chinelos à espera de ver areia. Já descalça percorro o caminho até ao chapéu ali plantado há 15 dias. Ninguém rouba. Fica na praia dia e noite, ora aberto, ora fechado, conforme o sol. Não o aproveito. Prefiro deitar-me fora da sombra e tapar a cara com um boné já gasto, da Gant. Pulverizo o creme no corpo e penso que não quero um escaldão. Alterno o sol com o mar e sinto o cheiro bom de um dia de folga, durante a semana. É raro.
Durmo ao sol.
A noite faz-se com cheiro a praia, à beira da piscina. Assam-se as entremeadas e o entrecosto. A salada verde cai fresca no prato e as salsichas são cortadas em pedaços para facilitar a mastigação. Bebo uma coca-cola com gelo e limão. Sabe a Verão.
Regressamos depois do documentário sobre Sinatra, na 2. Outra face do mestre, amigo de mafiosos. O barco vem quase vazio. Não está fria a noite. Depressa chegamos a Setúbal e apanhamos o carro no parque de estacionamento. Acabou o dia.
Beijo-o no ombro antes de adormecer. Sabe bem ter companhia na cama. Quem disse que hoje era dia de azar?
Cais do Sodré
- Pois é...
- É o trabalho não é? Quando chega à sexta à noite uma pessoa só quer ir para casa estender-se no sofá.
- Isso mesmo....
O comentário fez-me perceber que não tenho saido muito. E eu, que só ia beber um copo e retirar-me cedo, acabei por ir ficando e dançar até cair para o lado.
- dê-me uma água por favor?
- Água? De certeza que não prefere um vodka tónico??
- Está bem!
Ontem à noite fui ao Tóquio e ainda sóbria percebi claramente porque é que continuo a regressar lá sempre que posso. Após um dia de reuniões, a minha blusa de seda e as sandálias de salto alto contrastavam claramente com o ecosistema local. So what? Afinal, é por isso que regresso. Pela heterogeneidade sempre tão presente e partilhada que me leva a pensar que se a sede do mundo fosse naquela distoteca lisboeta viveríamos sempre em paz.
Desta vez, o cromo da noite - e digo-o com muito carinho - era um dos amigos que me acompanhava e que ao dançar me fez sorrir e recordar a Elaine num dos mais hilariantes episódios do Seinfeld.
Não sei se fui a única a sorrir mas acredito que, se outros o fizeram, foi por também perceberem o quão genuinamente divertido ele estava.
Tenho que voltar mais vezes. Agora só me resta esperar que um panasorbe e meio gurosan me consigam nas próximas horas tirar esta horrível dor de cabeça ressacada. Saudosos 20 anos :)
sexta-feira, julho 13, 2007
Post-it [*]
[O original - que há uma semana que não me sai da cabeça - está aqui. Preciso de me lembrar que vale a pena. Vale sempre a pena. E nem sequer é preciso muito.]
quinta-feira, julho 12, 2007
Chefe mas pouco II
O chefe-porreiraço tem sempre uma piada para dizer. É bem-disposto e bem-humorado, sempre com um sorriso ou uma gargalhada prontos a dar. Numa reunião não deixa escapar uma oportunidade para lançar uma graçola, chegando às vezes a autocriticar-se ou a criticar elementos menos amados dentro do local de trabalho. Toda a gente se ri com ele, porque todos estão de acordo em relação a esses mal-amados.
Receber um e-mail ou um telefonema do chefe-porreiraço é uma coisa normal. Ele está sempre lá, imperturbável, disponível, de teclado na mão com uma piada entre conversas. Se liga à noite, altas horas, mete uma 'bucha' para se desculpar e quem fica mal visto é o subordinado que estava a dormir àquela hora. O chefe-porreiraço não tem pruridos porque todos o acham o maior, e tudo lhe é perdoado.
Mesmo que ande de fato e gravata este chefe parece estar de calções e hawaianas. De tal forma é descontraído... desaperta o botão de cima da camisa branca e enrola as mangas com quatro voltas, até ao cotovelo. O casaco, pendura-o nas costas da cadeira, e no bolso tem sempre um pacote de pastilhas. Gosta de mascar mas não faz balões à frente de toda a gente. É um tipo porreiro.
Os colegas e chefes do chefe-porreiraço riem-se com ele e anseiam que ele não esteja na próxima reunião que, com a presença dele, durará por certo mais uma hora. Intervem por razões sérias mas, na maioria das vezes, é para confraternizar. Até que todos o mandam calar e ele continua a rir, divertido, quase infantil, e não resiste à próxima oportunidade. Com a persistência, os outros sorriem.
O chefe-porreiraço até manda, mas poucos o levam a sério. Às vezes pensam que mente, mesmo quando fala verdade. E às vezes pensam que ri, mesmo quando tem vontade de chorar. O porreiraço, enquanto chefe, é cá da malta. Está sempre pronto para umas cervejolas e anuncia saídas à noite mesmo que não tenha intenção de pôr o pé fora de casa. Vai a concertos e ao cinema e está sempre a par das novidades dos jovens. Tem um lugar na second life e, ao longo do dia, diverte-se a fazer vida dupla, enquanto esperam por ele para um almoço importante.
Nunca é despedido e raramente cai da cadeira. Se tentam chamá-lo à atenção descobre uma maneira de divertir o interlocutor e ele desiste. Não há coragem para impedir o chefe-porreiraço de ser palhaço. É tão natural rir com ele como trabalhar com um outro chefe qualquer, menos sorridente.
O chefe-porreiraço faz-se à vida com uma graça. É naturalmente dotado de bom karma e não se chateia com nada. Em tudo vê um lado positivo e uma forma de lançar a tal 'bucha'. É um chefe à maneira, bom para beber uns copos.
Mas isso não se faz no local de trabalho...
quarta-feira, julho 11, 2007
Chefe mas pouco
Há uma classe de chefes que é a mais penalizada. São os chefes-psicólogos.
O chefe-psicólogo está sempre disponível para os subordinados. Mesmo que esteja aterrado em trabalho, mesmo que esteja numa luta contra o tempo, este chefe consegue sempre uns minutos para ouvir as dores de quem com ele trabalha. É paciente e bom. Por isso ouvinte atento. É uma pessoa que pára de teclar e olha nos olhos do interlocutor quando ele surge com novos receios, novas queixas ou ressentimentos. E tem sempre o telefone ligado.
Normalmente este tipo de chefe sabe de cor a vida dos subordinados. Os assuntos que lhe são testemunhados são pessoais e relacionam-se com o amor, com dinheiro, com a falta de sorte na vida. O chefe-psicólogo sabe que A está prestes a divorciar-se e que B veio mais tarde porque teve uma discussão com o namorado, na noite anterior. Sabe ainda que C tem filhos e que o mais novo chorou a noite inteira, que fez birra de manhã e que detesta ficar na escola sem a mãe.
Este chefe nunca almoça sozinho porque tem vários pretendentes à sua companhia. Às vezes entram, em rotatividade, os subordinados, que precisam de uma palavrinha com o chefe. Todos os dias. A sua formação permite-lhe pagar um ou outro café - até mesmo um chá, de vez em quando - para que o queixoso esteja mais à vontade na conversa. Quem se queixa raramente tem moedas e, por isso, é o chefe quem oferece.
Toda a gente gosta de um chefe-psicólogo, excepto os subordinados independentes que não precisam de ajuda para os seus assuntos pessoais. Esses precisam de falar com o chefe sobre trabalho mas ele está, quase sempre, ocupado com a vida dos colegas. Este chefe empresta dinheiro, quando é necessário, porque sabe que a prestação de D foi mais elevada este mês. Também sabe quem ainda não recebeu o IRS e adivinha, pelas palavras envergonhadas de E, que o marido desta ainda não depositou o dinheiro do mês, na conta dos filhos.
O chefe-psicólogo é complacente. Não pode chegar atrasado porque quase todos os seus subordinados o fazem. Ele sabe que um estará doente, outro terá apanhado trânsito e um terceiro furou o pneu. Sabe ainda que os outros, os que não inventaram desculpas, chegam atrasados por culpa de terceiros, por culpa da vida, não por sua responsabilidade. Também não folga e raramente tira férias este chefe, pois tem de conciliar a sua vida com a de todos os que com ele trabalham. E a dos outros terá sempre prioridade.
Para o chefe-psicólogo há sempre os coitadinhos. Eles fazem-se passar por tal e chamam o chefe de amigo. O chefe não faz ideia porque, uma vez que nem conhece a família nem nunca foi lá a casa mas é amigo, no local de trabalho. Esta amizade obriga-o a dar presentes ao subordinado e aos filhos do subordinado quando fazem anos, e no Natal. Esta amizade obriga-o a perguntar, todos os dias, se está tudo bem. E a voltar a ouvir relatos porque nada está como deveria estar...
Não há recompensa para o chefe-psicólogo. Nem ganha mais por sê-lo, nem tem consultas pagas. Oferece tudo: o tempo, os conselhos, as dicas, os almoços. É um chefe experiente que acaba por trabalhar mais horas para compensar o tempo que perdeu a ouvir os outros.
O chefe-psicólogo também gosta de ser ouvido. Mas nem as suas ordens são integralmente cumpridas.
terça-feira, julho 10, 2007
Paredes
Desespero à procura da fotografia de uma parede branca. Pode ser uma parede qualquer. Mas não pode ser uma fotografia qualquer. Quero passar uma mensagem subliminar. Com um único alvo. Atraem-me as paredes brancas.
À minha volta discutem-se pesos e medidas. Tamanhos de soutiens. Dietas. Massagens. É uma versão profissional do Sexo e a Cidade. Acho saudável este riso desbragado. Contrasta com o silêncio carregado de outras horas. Dias em que a ‘vida’ se escreve em páginas de jornal. Em que não há tempo para mais. Dias em que luto para não pensar que está tudo errado. Hoje é um dia bom! Não há tempestades no horizonte. Pelo menos por enquanto. Respiro fundo e ganho alento para novas lutas.
segunda-feira, julho 09, 2007
Voo nocturno
Jorge Palma é, para mim, uma referência musical. 'Só' é uma das músicas mais bonitas que conheço. E há os clássicos, os que nos deixam rir, os que nos fazem sorrir, e aqueles que nos trazem lágrimas aos olhos. Porque a música de Palma é maioritariamente triste. Talvez sejam apenas tons graves, que os agudos ficam para outras cantigas. Palma parece estar sozinho no mundo da música, mesmo quando junta uma série de amigos como fez agora, no último teledisco, com 'Encosta-te a mim', onde aparecem, por exemplo, Camané e Mafalda Veiga.
Mas os génios têm defeitos, e o de Jorge Palma é fazer-se acompanhar por uma carroça. Sempre. A entrevista que deu à SIC Notícias, a propósito deste novo álbum assim o demonstra: cabelo despenteado como se tivesse visto o monstro de Loch Ness, óculos de sol pendurados na ponta do nariz, e uma voz arrastada, pensamento lento, whisky descontrolado. É uma pena.
Há uns dois anos assisti a um concerto ao vivo, no CCB. Completamente bebido. Chegou atrasado, tinha a camisa desaboatoada e mostrava o peito e a barriga descaída. Cantou afinado, porque tem voz, mas com o álcool sempre presente. Não muito tempo antes tinha-o visto no Pavilhão AtLântico, garrafa de água ao lado do piano, e algumas piadas sobre o passado. Mas o passado fez-se futuro e diz-nos o presente que Jorge Palma não abandonou a bebida. Está preso a ela, como ficamos presos à sua música. É uma pena.
O disco acabou e tenho vontade de pô-lo novamente a tocar. As músicas são todas boas, apesar de algumas ficarem mais no ouvido que outras. Mas diz-me a experiência que todas ficarão para sempre. Palma tem uma estrela (do mar) que faz dele um escritor de canções, um músico fantástico. Só não sabe como gerir a carreira.
Gostava de o ver sóbrio. Com a sobriedade com que faz um disco. Mesmo sabendo que muito do que nasce vem-lhe do estado já desviado da normalidade. Mesmo imaginando que a canção lhe surge com um copo na mão. Ainda assim, gostava de o saber sóbrio. É uma pena que ele não se sinta bem assim...
Lemmings
Estados d'Alma [viii]
Esta noite não estou cá
Quando a tristeza bate
Pior do que eu não há
Fico fora de combate
Como se chegasse ao fim
Fico abaixo do tapete
Afundado no serrim
Não queiras saber de mim
Porque eu estou que não me entendo
Dança tu que eu fico assim
Hoje não me recomendo
Mas tu pões esse vestido
E voas até ao topo
E fumas do meu cigarro
E bebes do meu copo
Mas nem isso faz sentido
Só agrava o meu estado
Quanto mais brilha a tua luz
Mais eu fico apagado
Amanhã eu sei já passa
Mas agora estou assim
Hoje perdi toda a graça
Não queiras saber de mim
Dança tu que eu fico assim
Porque eu estou que não me entendo
Não queiras saber de mim
Hoje não me recomendo
[Rui Veloso]
domingo, julho 08, 2007
Dr. House II
Tento não perder um episódio de House. Já comprei as duas séries e aguardo ansiosamente a terceira, que deverá sair em Setembro. Gosto particularmente do desempenho do médico principal, coxo, arrogante, espirituoso, interessante, inteligente. Fico agarrada aos diálogos e tenho vontade de fazer rewind na televisão, para perceber melhor o que foi dito, e porquê. Mas isso só é possível nos dvds...
Na semana passada fiquei a saber que Hugh Laurie escreveu um romance. Está disponível na FNAC, já sei, esse Gun Seller, versão apenas inglesa. Ainda não tive oportunidade de comprá-lo porque não há na FNAC onde mais vezes costumo ir - pelo menos uma vez por semana - mas já vi que existe, na net. E vou lê-lo num ápice.
Fiquei a saber deste livro por causa de uma entrevista do actor no Inside Actors Studio, no AXN, creio eu. O homem é único e o sentido de humor de House está na pele de Hugh Laurie. Curiosamente, nessa entrevista, pude saber um bocadinho mais sobre a vida do senhor, nomeadamente os problemas com a mãe - que já morreu - por quem não se sentiu suficientemente amado. Fala dela com saudade mas com alguma amargura. Pelos vistos, os pais não se sentiam orgulhosos dele, e só quando ele pisou os palcos começaram a sorrir perante as suas piadas.
Laurie é um homem do riso. Contracenou com Rowan Atkinson (o Mr. Bean) e entrou em várias comédias. Mas, na minha opinião, é como House que cresceu. É no papel do médico alucinado que vive melhor. As expressões são as mais indicadas para cada momento, a pronúncia é americana e encenada - ele é inglês - e o andar, de bengala, é imitado na perfeição. Custou-me ver House andar sem coxear, na entrevista.
House também toca piano. Aliás, Hugh Laurie toca piano. E bem. Ainda para mais escreve letras, com piada, claro. O homem é brilhante. Não que os restantes actores não sejam bons - não sei se voltarão todos, na próxima série - mas House é o expoente máximo da boa interpretação.
Enquanto houver casos clínicos, ele lá estará para salvar vidas. E parte da minha semana.
sexta-feira, julho 06, 2007
Cash Flow
Esperava pelo IRS e pelos subsídios de férias e de Natal como quem espera um filho. Ali ficava com o ventre em festa, às vezes preso na amargura, apertado, enquanto não caíam os euros na conta. Julho e Dezembro eram os meses maiores. Nessa altura desforrava-se. Pagava as contas e lá ia às compras, à procura de um trapinho, que tudo lhe ficava bem.
Juntava trocos para a depilação e para arranjar as unhas. Não dispensava nenhuma destas obrigações femininas. Mesmo de calças compridas gostava de ter as pernas limpas, sedosas, como via nos anúncios de televisão. E usava um creme todos os dias, para hidratar a pele. E as unhas, pintava-as de vermelho - carmim, para ser mais exacta - sempre com uma manicure brasileira porque lhe tinham dito que eram as melhores e que faziam milagres com mãos estragadas.
Este mês estava lisa. Andava a planear uma viagem e nem sabia como pagá-la. Tinha imaginado Nova Iorque mas nem as promoções estavam do lado dela. Optou pela Europa, uma coisa mais perto, também uma cidade grande, mas com História. Escolheu Madrid e já tinha as agendas de exposições do Prado e da Rainha Sofia. Também já sabia que espectáculos podia ver na noite espanhola, na movida. E sabia em que restaurantes comer. Só não sabia como pagar tanta coisa. Tinha descontos nos museus, mas só isso. Teria de desembolsar para tudo o resto. A viagem estava permanentemente adiada.
Chorava baixinho, à noite, em casa. Sozinha, com os extractos do banco na mão. Nem tinha um ordenado baixo, mas as despesas eram mais que muitas. Era uma descontrolada com os presentes para os amigos e cada aniversário tomava-lhe uma parte da carteira gasta pelo uso. E havia os jantares, com festa. Tudo caríssimo. Limpava as lágrimas com os soluços e punha-se a pensar no que podia fazer para ser aumentada. Nada. Já tinha feito tudo o que era viável fazer. A economia estava em crise e a Fundação onde trabalhava não dava dinheiro. Estava sem saída.
Tinha uma nota de 10 no bolso dos jeans. Ia tomar um café, naquela noite de Verão. Foi quando a viu: uma velhota sentada à beira de uma árvore no meio da cidade. Não lhe pediu nada. Tinha o olhar preso ao chão e lenço verde na cabeça. Não tinha frio, que a noite aquecera, mas os cartões ao lado indicavam a cama para a madrugada.
Voltou para casa sem ter bebido o café. Sorriu quando sentiu o bolso vazio. Estava mais rica e percebeu porquê.
No mês seguinte sobrou-lhe dinheiro.
quinta-feira, julho 05, 2007
Ainda o divã...
Os outros doentes entravam e saíam sem olhar para ela. Nem boa dia, nem boa tarde. Teriam vergonha de assumir o divã? Ela sorria sempre que alguém passava e dizia aos amigos 'hoje vou ao médico dos malucos'. Sentia-se uma, às vezes. Não por causa da cabeça confusa - já se sentia muito melhor - mas porque continuava a ir. Já não tinha o que dizer e lá estava, agora quinzenalmente, no consultório do 11º andar.
'Hoje não tenho novidades, doutor'. Ele cofiava a barba e ficava à espera de mais. Ela ficava a olhar os tais pormenores na parede e no tecto e mantinha-se calada. Desistia quando pensava no dinheiro que aqueles 45 minutos lhe custavam. Então falava. Ocasionalmente falava do passado, mas era agora o presente o tema de conversa. Talvez por isso não tivesse o que dizer... o presente não a atormentava. Era praticamente feliz.
Raramente levava relógio e só sabia do fim da consulta pelas palavras dele. 'Então até para a semana'... 'Não, até daqui a quinze dias'... Sabia-lhe tão bem não voltar para a semana. Na verdade, saber-lhe-ia bem não voltar nunca mais. Mas o doutor era peremptório: 'Ainda não, ainda não está preparada'... Sentia naquelas palavras uma obrigação, e voltava.
O guardanapo de papel estava enrugado. Atirou-o para o lixo e pôs um novo sobre a almofada de veludo verde. Deitou-se de barriga para cima. Não tinha nada para dizer, e ainda lhe faltavam 45 minutos...
quarta-feira, julho 04, 2007
Amanhã na Dinamarca

Uma Casa da Ópera de "luxo", pela simplicidade das linhas de uma infra-estrutura que pode albergar mais de 1500 pessoas, equipada com tecnologia de ponta. Gerações vindouras vão agradecer para sempre ao armador e empresário petrolífero de 92 anos que deixou este tesouro de mais de 3 mil milhões de euros à sua cidade.
Ontem na Dinamarca
terça-feira, julho 03, 2007
segunda-feira, julho 02, 2007
Urgências
É urgente deixar de ler autores africanos. Principalmente os meus angolanos de eleição. Angualusa, Pepetela, Manuel Rui. Qualquer um deles me faz ter a certeza que estou no lado errado do mundo.
[URGÊNCIAS 2007
Em cena até 29 de Julho no Teatro Maria Matos, em Lisboa]
A Liberdade de Imprensa ou Momento corporativista
O grupo de jornalistas abaixo assinados constatando que se encontra em marcha o mais violento ataque à liberdade de Imprensa em 33 anos de democracia, decidiu juntar a sua voz à de todos os cidadãos e entidades que se têm pronunciado sobre a matéria e manifestam publicamente o seu repúdio por todo o edifício jurídico aprovado pela Assembleia da República, ou à espera de aprovação, referente à sua actividade profissional, que consideram limitativo do direito Constitucional de informar e ser informado.
domingo, julho 01, 2007
Água benta
Um dia tentei construir uma família e não resultou. Não desisti de uma segunda tentativa. Mas quando o fizer - acredito que tal acontecerá - a mesma Igreja em que acredito não me dará a 'benção'. Estarei fora das normas porque não viverei uma família num primeiro casamento. E é injusto.
Ela entrou ontem na dita família cristã. Estava de branco com umas florinhas amarelas no vestido, o mesmo fato que a mãe já usara em igual circunstância. Não chorou em momento algum. Nem quando lhe derramaram a água pela cabeça... Ali esteve, serena, atenta, curiosa.
Acredito que esta é uma família especial. Creio que - a ter filhos - eles farão sempre parte desta comunidade. Não hesitarei em baptizá-los. Mas será nessa mesma Igreja que vai condenar a minha união, esteja ela em que pé estiver. Não será uma união católica. Já tive uma...
Às vezes questiono-me sobre o valor da Igreja nas sociedades actuais. Pergunto-me se não seria melhor adaptar-se à realidade dos nossos dias. Já poucos fazem um casamento para a vida, e são menos ainda os que o fazem pela Igreja. Eu acreditei, quando apostei nessa solução. Fazia sentido, há seis anos. Hoje tenho dúvidas. Não pela fé e pela essência do cristianismo... mas pela forma como os católicos olham para as diferenças. Diferentes são os que não conseguem manter uma família à primeira. Diferentes são os que se amam e optam por não 'validar' essa união. Diferentes são os pais que não programaram os filhos, mesmo que os aceitem com todo o amor. Diferentes são os que não se regem pelas leis da Igreja. Muitas vezes porque já não podem...
Ela foi baptizada no seio de uma família perfeita. Também à luz da Igreja. Espero que cresça feliz pela opção dos pais. Também acredito que esta é sempre uma opção dos pais. Tão obrigatória como ir à escola...
Galináceos no Museu
Pessoas sozinhas, casais, grupos de amigos, famílias. Eu ia com os meus dois afilhados. Ela, 10 anos; ele 5. Têm a cabeça destapada e protejo-os do sol enquanto a fila não entra no edifício. Ele está irrequieto e começam os comentários à primeira obra, à porta, uma escultura de Joana Vasconcelos feita com garrafas de vidro. É verde, 'parece uma árvore'.
Entramos. Não sem antes passar pelos avisos de 'não comer, nem beber', 'não levar mochilas', 'sorrir', 'namorar', 'gostar'...
Começamos pelo Surrealismo - a fase preferida do nosso Primeiro-Ministro - e vemos Man Ray, Cesariny, Picasso, Dali... sentamo-nos nos bancos para observar obras maiores e descemos para o Minimalismo. É onde encontramos as magníficas fotografias de Helena Almeida.
Já com a hora de almoço ultrapassada, ele começa a sentir fome. Aguenta um pouco e continua a ver cada peça, ansioso por tocar nos quadros. Brincam os dois nas instalações aos quadradinhos de Pedro Cabrita Reis. É então que ele vê uns quadros feitos em relevo, cores espalhadas na tela, formas por definir... autor já esquecido.
- Tia, este aqui parece que tem um frango lá dentro!
Saímos para almoçar.