domingo, abril 29, 2007

A Dia casa hoje no Jardim da Estrela.

Recebi ontem à noite uma mensagem que dizia apenas ‘não te esqueças. É amanhã’. A Dia é a mulher a quem ‘nada de extraordinário acontece’, porque nada na sua vida é vulgar, e por isso ela acha que tem que recordar aos amigos que amanhã é o seu dia. O A. não ajuda. Afinal apareceu na Estrela, contava-me ela ontem à noite, uma semana antes da data marcada e ainda ligou para saber porque não estava lá ninguém. Conheci a Dia na caixa de comentários de um blog de referência - porque eu vivia num argumento de série Z, de um Deus cruel e com um grande sentido de humor, e a Dia estava solidária comigo -, de onde fomos corridas apelidadas de delicodoces. Descobri-lhe a escrita durante as noites frias de Dezembro e enviei-lhe a medo um email de elogio. Ainda hoje me deslumbro com a capacidade de escrita desta mulher. Li-lhe os arquivos de uma ponta a outra. E foram precisas muitas noites, num blog em que o tamanho médio de um post anda nos 8.000 caracteres. Isto foi muito antes de entrar em cena o Mr. 50.000. E ela esperava tanto deste leitor. Amanhã leva-o ao altar.

Poucos dias depois do meu primeiro email à Dia, ainda sem me ter sequer posto a vista em cima, ela convidava-me para passar o fim de ano lá em casa. Ela dizia naqueles dias – os dias A.J. – que dependia da bondade de estranhos. Quantas vezes não foram os estranhos a depender da bondade dela... Depois disso passamos noites e noites quase em claro em conversas intermináveis na janela do messenger. Eu no meu tapete vermelho. Ela no seu sofá laranja. Noites em que a produção bloguista atingia níveis inimagináveis. A Dia trata-me por Esquizo. De esquizofrenia. De adolescente esquizofrénica. Porque assim eram os nossos diálogos. Muitas conversas cruzadas. Sobre tudo e sobre nada. Acho que a maior parte era sobre nada. Quanto nos rimos. Quanto choramos... por isso Dia, que não te passe pela cabeça que me posso esquecer de ti.

Somos pelo menos duas...

entre dúzias que se refugiam no trabalho braçal quando insatisfeitas com o do espírito. Tudo o que permita ver o quer que seja materialmente acabado, serve.

in Quatro Caminhos

sábado, abril 28, 2007

Memórias

Irrita-me a capacidade que tenho de me lembrar de coisas perfeitamente inúteis. Espaço desperdiçado num disco rígido de dimensão limitada. Nunca sei o que é realmente importante. Ainda me lembro do nome dos irmãos do meu primeiro namorado (eram seis!) e já não os vejo há mais de quinze anos. Nunca me lembro que a Miranda têm medo de cobras, faço comentários despropositados enquanto fazemos uma caminhada por entre ervas altas e mando-lhe vídeos com cobras. Vejo como se fosse hoje o B. no dia em que o conheci, o que me disse. Nunca sei o nome do presidente da CGD ou de muitas das minhas empresas xpto. Lembro-me do que vestia no meu primeiro encontro com o S.. Nunca fui capaz de me lembrar do filme que vimos, por muito que ele fale dos actores e do argumento, por muito que goste de cinema. Sei quando vi o L. pela primeira vez, a meio de um cigarro fumado à pressa entre duas perguntas de uma frequência de direito político. Não me lembro de uma linha da sebenta dessa mesma cadeira. Lembro-me Lembro-me da primeira vez que vi a Charlotte, há oito anos. Não me lembro da sensação de pegar pela primeira vez no F., dois palmos de gente engelhada que hoje recordo por fotografias. Nunca me lembro do nome do meu orientador de tese. Lembro-me como se fosse hoje de uma mensagem recebida a caminho da Comporta num dia de chuva. Falava de ópera. E depois há as memórias olfactivas. As piores de todas. São tramadas. Apanham-me de surpresa. Desarmada...

terça-feira, abril 24, 2007

Livros

Lisboa, 20 Abr (Lusa) - A iniciativa "Lisboa Cidade do Livro", que arranca segunda-feira, Dia Mundial do Livro, vai custar 520 mil euros, incluindo a participação camarária na Feira do Livro, informou hoje o director municipal da Cultura, Rui Pereira.

Tenho cada vez menos tempo para me deleitar com longas maratonas de leitura, mas não perdi a paixoa pelos livros. Além disso, Junho é desde sempre o meu mês de eleição. Porque faço anos. Porque há santos populares. Porque há dias compridos e noites quentes. Porque há livros no Parque Eduardo VII. Agora vem o Francisco José Viegas dizer que também há livros em Maio. ‘Para abrir o apetite’, diz. A gerência agradece que haja mais livros em Lisboa. Que se façam eventos, ainda por cima no Carmo e na Trindade. O que não precisamos [preciso] é de mais feiras do livro. Já é tão difícil manter a conta bancária equilibrada com duas semanas de feira do livro. Ainda por cima preciso de uma estante nova. As lá de casa já não chegam. Mas o que dava mesmo jeito era tempo para por as leituras em dia antes que chegue Junho.

[Este post foi começado no dia 20 e ontem foi Dia do Livro, mas eu estive ocupada a acabar o 'Kafka à beira mar'. E ouvi duas horas de Fórum TSF a caminho do ALentejo. Gostei deste tempo a ouvir falar de livros.]

sexta-feira, abril 13, 2007

Enquanto espero...

Isso é que era
As sete e meia despertei com a habitual betoneira e com a gritaria dos pedreiros. Dizem que a maçonaria é discreta, mas a verdade é que dá uma vizinhança terrível.

No carro.
- Filho está sossegado! Não tires o cinto!
[passado poucos segundos]
- Não me ouviste? Está quieto.
[G. continua a tentar tirar o cinto da cadeirinha e a ignorar-me. subo o tom de voz]
- Vamos ser multados pelo polícia!!!
[G. muito calmamente]
- Acho que estás a exagerar...

A minha aldeia
Tenho o carro entalado por outros três. Vou à mercearia perguntar se sabem quem são os donos das viaturas.
- Olhe, esse aí é da loja das tatuagens, o outro é da sexshop e o outro é da loja dos sprays para grafitti.
Adoro a minha aldeia.

quinta-feira, abril 12, 2007

[Sábado.10h]

Mais um dia

Há dias em que gostava de ser a Dia e que este blogue fosse a [T]ralha. Gostava de poder dizer tudo. Queixar-me. Dizer mal do mundo. Do pequeno mundo que se confina nestas quatro paredes. Não posso. Por pudor. Por cobardia.

terça-feira, abril 10, 2007

Desencontros

Era, à partida, uma relação condenada. Ela queria ter dois filhos e ele recusava-se a ter um, sequer. Não falavam abertamente no assunto, mas cada um percebia o ponto de vista do outro. Nos momentos em que a questão vinha à baila, mudavam a conversa e contornavam a situação.

Gostavam um do outro. Talvez já se amassem, até, ainda que também não o dissessem alto. Era uma relação de segredos mas quase perfeita. Não havia angústias, nem mágoas, nem discussões pendentes, nem perdões por perdoar, nem mazelas para esquecer. Mas havia uma espécie de iato nas conversas sempre que aquele assunto chegava à mesa. Ou à cama.

Ela tinha imaginado uma família completa, uma casa com crianças a brincar, sons de risos e outros que só os mais novos têm. Tinha-os imaginado a correr de um lado para o outro, a fazer perguntas ao pai que era um homem esperto, a fazer perguntas à mãe, uma mulher doce e com paciência. Ele imaginava-se sossegado em casa. Com os seus filmes e dvds, com os seus livros, com as suas coisas, sempre com ela ao lado. Mas só com ela.

Pareciam um casal feliz mas ela sentia-se incompleta.
Não sabia quanto tempo teria mais de esperar para avançar com a conversa. Às vezes, à noite, chorava baixinho, com medo da resposta.
Ele secava-lhe as lágrimas como se percebesse a razão e dizia-lhe que gostava dela. Que gostava muito.
Então, ela adormecia.
E no dia seguinte pensava em tudo outra vez.

sábado, abril 07, 2007

Páscoa

Eu acredito que Ele ressuscitou. Parto desse princípio. Muitas vezes, na minha vida, é a Ele que recorro a pedir mais prudência, melhor consciência, um caminho que não encontro. Sei que parte de mim, porque Ele está comigo. Acredito nisso todos os dias da minha vida, mesmo naqueles mais traiçoeiros, mais tristes, menos dados a crenças.

Eu não cumpro todos os preceitos da religião católica. Nem sequer vou à Missa todos os domingos. Já lá vai o tempo em que participava em dois coros e assistia a duas missas por semana; dava catequese, assistia à reunião semanal do grupo de jovens, tinha iniciativas e participava nas dos outros. Já lá vai o tempo... não muito, mas o suficiente para me sentir afastada dos Homens daquela Igreja onde cresci. Não de Deus, mas dos Homens.

Muitos não sabem mas a Páscoa é, para os católicos, mais importante que o Natal. E o facto de ser menos comercial também ajuda a vivê-la de uma forma mais sensata, serena, com os olhos postos na verdade em que acreditamos. O Natal celebra o nascimento, a Páscoa a Resssureição. E só Cristo Ressuscitou ou teve o poder de dar a vida a outros. De novo.

Anda por aí um livro que dita o fim da fé. Ainda não o li mas tenho alguma curiosidade em lê-lo. Na Mesa do Café, blog aqui do lado, anda a ser fervorosamente discutido. E por católicos, sei-o eu. Não tenho ainda opinião sobre o autor nem sobre o livro, dado que não os conheço, mas, à partida, acredito que a fé não morreu. Talvez as práticas estejam a descrescer, mas a fé, para os que sabem o que ela significa, mantém-se segura.

Eu acredito na Páscoa, no terceiro dia, na Ressureição. E é nesta forma de pensar que vivo os meus dias. Porque a morte, só por si, não me diz nada.

sexta-feira, abril 06, 2007

Shakira, outra vez

aqui falei dela. Shakira, a cantora que não ouço cantar mas com quem simpatizo há largos meses. Desta vez coube-me entrevistá-la.

Volto a falar dela porque o normal não é ser como ela, quando se é uma vedeta. O normal é-ser-se distante, arrogante, difícil, impenetrável... até os nossos artistas que ninguém conhece - senão o público português - são assim, quanto mais os reconhecidos à escala mundial, com carreiras feitas nos quatro cantos do mundo, com fãs verdadeiramente apaixonados, deslumbrados, fanáticos.

Shakira é uma miúda simples. Digo miúda porque sou mais velha do que ela e porque já por duas vezes pude falar com ela de igual para igual. Desta vez entrevistei-a à porta do aeroporto de Figo Maduro, em Lisboa, com alguns seguranças em cima dela e um manager a pedir-me que apressasse a coisa. Ela ia subir ao palco daí a duas horas, estava a acabar de aterrar em Portugal e, mesmo assim, não teve problemas em sair da carrinha de vidros fumados para me cumprimentar e falar comigo. Em português, porque ela esforça-se para falar a nossa língua. Mais um ponto a favor.

Levei a minha sobrinha de 9 anos ao concerto. Ela ficou calma, a ouvir as músicas, a ver a Shakira dançar como ninguém, a entoar um ou outro refrão mais conhecidos... e eu ponho os olhos nela. É uma miúda que adorou assistir o concerto de Shakira, da mesma maneira que há um ano adorou os concertos na Festa da Música, no CCB. E é assim que deve ser... sem preconceitos: e se a rapariga aparece menos vestida, se os discos têm, na capa, expressões sensuais e praticadas à frente do espelho, se as letras são, no mínimo, duvidosas... isso não importa. Não importa porque estamos a falar de uma mulher diferente. Transborda simpatia, deixa-se levar pelo público, esforça-se por agradar, tem a auto-confiança no ponto certo. Nem mais, nem menos.

Eu gosto mais da Shakira. Eu orgulho-me por ter feito a entrevista mais radical da minha carreira, nas condições mais estranhas e desconfortáveis. Qual tripé, qual iluminação xpto... não. Ela ali estava, a falar à porta da carrinha, para um microfone de mão, no meio de um vendaval e com aviões a passar deixando o devido rasto de ruído. Escusou-se a falar? Não. Riu-se comigo. E foi um sucesso.

terça-feira, abril 03, 2007

O meu amigo casou-se...

Casou-se com outro amigo - depois namorado e noivo - e agora marido. Foi o meu primeiro evento homossexual. E não me pareceu, em nada, diferente das outras festas de casamento a que já fui. E se tenho experiência...

Eu sou católica e tenho, pelo casamento, um respeito acima da média, até porque fui obrigada a divorciar-me quando, o que eu queria mesmo, era uma vida feliz para sempre. Agora, a felicidade começa a surgir, mas foi interrompida num momento em que eu não queria vê-la partir. Mas isso faz agora parte do passado... - Eu casei por amor. O meu amigo também. E o noivo do meu amigo idém. Por isso nada me transtornou estar neste evento, pós-casamento à séria, sem véu e grinalda - mas isso nem eu quis levar - mas como manda a lei. Pelo menos, uma certa lei.

Lamento que por cá ainda não possam casar-se, os homossexuais. Parece-me que o conceito de família está já arrastado e desfigurado pelos heterosexuais, e não será por causa do casamento entre dois homens ou entre duas mulheres que as coisas vão piorar. Naturalmente prezo a família, e lamento que a família não preze o amor. A família do meu amigo não olhou tanto ao amor e à felicidade do noivo, antes se afeiçoou a comportamentos antigos e a conservadores que, nos nossos dias, não podem fazer sentido.

O marido do meu amigo é um doce. Tem um sorriso apaixonado, nota-se que gosta mesmo dele, dá-lhe a mão carinhosamente e enche-o de boas surpresas. O meu amigo é mais feliz desde que estão juntos. E o que me interessa é ver o meu amigo feliz. O meu amigo também muda, quando quem está do outro lado é o agora marido. Torna-se mais confiante, mais positivo, mais alegre. E ouviram-se gargalhadas na festa de casamento. Eram as dele. Sem preconceitos.

O meu amigo às vezes passa por aqui, por este blog. Não sei se vai ver este post, desta vez. Mas se o vir, eu quero que ele saiba que me orgulho dele, da coragem que teve, do arrojo e da teimosia. Orgulho-me dele porque não desistiu de um sonho que surgiu assim, ao de leve, e foi crescendo como possibilidade séria. Eles concretizaram um sonho que muitos não conseguem nem imaginar. Eu achei a festa bonita e a troca de votos muito singular. Nenhum se calava e os discursos foram de amor eterno. Eu acredito nisso e quero senti-los bem. Um com o outro. Com a sociedade. Com quem os rodeia.

Pela minha parte, tanto me faz que as alianças sejam de ouro branco ou amarelo. Tanto me faz que sejam ambas de tamanhos grandes e que caibam nos dedos de dois homens. Importa-me apenas que saibam o que estão a fazer. E essa consciência, viu-se.

segunda-feira, abril 02, 2007

Rescaldo

Foram presos cinco gajos da claque do FCP. Depois do que assisti ontem na Luz até acho pouco. Indigna-me o resultado do jogo. Foi injusto. [não quero, nem devo, por falta de conhecimentos técnicos dissertar sobre o assunto]. Mas, independentemente do marcador, o que me deixou verdadeiramente puta da vida foi assistir ao lamentável espectáculo dado pela claque do FCP. O que me deixa realmente furiosa é não poder entrar com uma garrafa tapada dentro de um estádio, e ver que estes tipos continuam a entrar com petardos para as bancadas. A verdade é que num jogo de alto risco, não fui sequer revistada. É simples, basta entrar em cima da hora e é sempre a abrir. Não percebo a impassividade da polícia e dos ‘stewarts’ da Prossegur. Rebentaram três petardos, foram outros tantos adeptos do Benfica para o hospital. E os tipos do FCP continuaram a ver o jogo. Contentes da vida. Entendo que não tenham levado um enxerto de porrada logo ali. Violência gera violência. Mas não entendo porque não foram todos expulsos logo que rebentou o primeiro. Provavelmente não é para entender.