domingo, março 04, 2007

Hoje é domingo e acordei

Oiço a máquina da roupa às voltas pela segunda vez, esta tarde. Lençóis e tolhas, roupa branca que se acumulava no cesto da roupa suja, como tudo se acumula, na minha vida, ao longo da semana. E depois respiro.

Há dias em que apenas suspiro. Cabeça enfiada na almofada, cobertores e edredão em cima mais um lençol e uma manta porque sou mesmo friorenta e os olhos pesados que não me querem tirar dali, a cabeça às voltas com os sonhos que sonhei, o corpo preso na cama que dobra e faz massagens mas que não disfruto há meses. Suspiro de manhã quando já é tarde, quando já começou a reunião no trabalho, quando já sei que o meu lugar está vazio, quando sinto que já notaram a minha ausência.

Hode é domingo e acordei. Eram duas da tarde, mas acordei. Lutei contra o corpo preguiçoso, o mau-feitio e a falta de vontade, contra os comprimidos que me deixam assim, contra os sonhos que se atropelam e transformam-se em pequenos pesadelos... Ergui-me para ir tomar um pequeno-almoço que, para além do costumeiro galão e pão de cereais com manteiga incluiu um cheesecake. Há mais de um mês que não comia cheesecake e este soube-me pela vida, como se costuma dizer.

A minha casa não era uma casa quando voltei a entrar. Era um antro de caixas e caixotes trazidos do IKEA, roupa na sala e no quarto, tudo por arrumar. Roupa lavada na lavandaria do senhor Carlos que, de quinze em quinze dias, leva tudo para passar a ferro porque eu já não consigo assegurar a tarefa. E livros por todo o lado, sapatos e malas espalhadas, bem ao gosto de uma loja em saldos. Últimos dias.

Depois foi o abrir das tais caixas e caixotes, montar uma estante nova - fica linda - e descobrir que os outros objectos que comprei - mais uma estante e um charriot - não traziam as peças todas. Sentei-me no chão quase a desistir. Como podiam as peças não estar lá? Eu paguei um produto que garante tudo e mais alguma coisa - menos grande qualidade, já se sabe - para que a pessoa possa distrair-se no bricolage.
E lá pus tudo de parte e incluí, para esta semana, uma ida ao IKEA para reclamações. E amanhã chega um sofá novo cá a casa.

A máquina já parou e não rodopia na minha cabeça. Sei que está frio lá fora mas, ainda hoje, me chamam para estender a roupa que foi lavada ainda agora. E se deixasse para amanhã? Ainda vou ver como está o tempo e decidir o que fazer. Mas tiro tudo da máquina para evitar as rugas e os embrulhos para o senhor Carlos.

Este domingo acordei e não pude almoçar. Já passava da hora de almoço. O jantar também se apressa em fugir porque não descongelei nada e esta solidão tira-me a fome. Amanhã acordo para receber o meu novo sofá e para ir trabalhar. Amanhã tenho desculpa para não me sentar numa daquelas cadeiras da sala do director. Mas depois não, nem depois, nem depois. Terei de acordar e sair da cama como faz toda a gente que tem horários para cumprir. O meu relógio está confuso e exige-me mais horas na cama. Mas terei de fazer de conta que não é domingo, para me levantar e sair de casa. Talvez deixe a cama por fazer...

Hoje é domingo e acordei sozinha. Os meus vizinhos estão todos aos gritos, aqui ao lado.

5 comentários:

Isa disse...

e este post tá muito bom!

Anne Marie disse...

... um beijinho de boas energias para o acordar de todas as manhãs! Força!
:)

Anónimo disse...

Porque se expõe desta maneira?

Anónimo disse...

Hoje é terça e eu tou parvo com este post!
Que escrita fenomenal!
Quase imagino a máquina de lavar roupa a rodopiar ferozmente enquanto faz a centrifugação da roupa!
Cá em casa não sou responsável por esse departamento (nem por esse nem por nenhum diga-se de passagem) mas compreendo o sofrimento!

Voltarei!

Beijinhos

El-Gee disse...

Altamente depressivo. Altamente cru. Altamente real.