segunda-feira, julho 31, 2006

Certezas

Sento-me à beira rio. Pés descalços no mármore aquecido pelo sol. Não devia. Aqui há baratas. Lembras-te da noite das baratas? Do meu riso infantil. Do teu medo irracional. Como é que alguém do teu tamanho pode ter medo de baratas? Nojo sim, mas medo? Sempre disse que havia de escrever sobre as baratas. Sim, sei que prometi não o fazer. Mas agora não faz mal, não achas? Ninguém vai perceber. Há muito que deixei de escrever para ti. Há muito que deixei de vir a este rio por ti. Está tudo devidamente armazenado. Só as coisas más teimam em sair. Não! A culpa não é tua. Já nada desse tempo dói. Ficaram só as memórias felizes a boiar entre flocos de esferovite dentro da caixinha verde alface, onde se lê ‘handle with care’. O mal está em mim. Acho que foi um vírus que apanhei. Talvez no pólen das flores da primavera passada. Qualquer coisa que comi. Não sei. Se fosse ao médico, o senhor de bata branca [podia ser o otorrino do Santa Maria, um homem de olhos cor de mel que um dia me quis operar e a quem ainda hoje me arrependo de não ter convidado para sair. Devia comer sardinhas. Revi-o quando lá voltei com a H.R. porque ela tinha espetado uma espinha na garganta] diagnosticava-me uma virose. Uma daquelas doenças que não entendem [reparo agora que uso cada vez menos o verbo perceber, ainda que sejam sinónimos. Apanhamos facilmente os tiques de linguagem dos que nos estão próximos. O L. dizia que era sinal de perda de personalidade, mas o L. enganava-se em tanta coisa], que não se encaixam nas letras alinhadas dos compêndios escolares, e por isso nos despacham com uma caixa de antibióticos. Para tomar de 12 em 12 horas. Mais uma caixa de aspirina para as dores. Mas este é um mal que não dói. Limita-se a moer, lentamente como quem faz farinha. Aposto que se apanhasse cada grão, cada partícula... Esquece. Não era nada disto que queria escrever. Isto não era uma prosa triste. Começou com o riso por causa das baratas e tem que passar pelo sol que deixa nas águas um tom prateado. É um post sobre a paz que me invade sempre que me sento no mármore que desce para o Rio. Mesmo que do outro lado não existam montanhas ou campos verdes. Mesmo que o burburinho incessante seja de carros e não de pássaros. É um post sobre a clareza, tão diferente da cor das águas que correm para a foz, com que vejo a vida. Uma prosa sobre a certeza de que tudo acaba bem. E se não está bem, é apenas porque ainda não acabou. É um post sobre esperança e a certeza de um amor.

Sim, estou nostálgica e depois?

Os dias de estio continuam a correr devagar. Metade do País está de férias. A outra faz o que costuma fazer durante o resto do ano, ou seja, nada. Os jornais enchem-se de notícias internacionais. ‘Salva-nos’ a guerra no Líbano. O aumento do preço do petróleo. Pela primeira vez em muitos anos passei uma semana sem comprar jornais. Por opção. Por cansaço. De nacional só os incêndios, os afogamentos, as explosões em fábricas de pirotécnica [se ainda não houve nenhuma, não deve tardar] e os ‘fait divers’. A televisão também passou mais horas apagada. Nos dois ou três noticiários que saltaram da caixa vi, pelo menos duas vezes, uma história sobre as brigadas da PSP que guardam as casas de quem vai de férias. Não há notícias. O País foi-se embora. E enquanto o telefone me devolve o som interminável de chamada, enquanto do outro lado não me atende o senhor engenheiro ou o senhor doutor, que por esta altura devem queimar as horas ao sol tórrido do Brasil, ou em alguma praia perdida no Pacifico, vou revendo mensagens antigas. Uma conjugação de verbos e substantivos que o tempo libertou do excesso de ‘açucar’. Leio palavras que hoje fazem sentido e que me deixam nos sentidos um sabor a saudade.

Patrocínios

Troco a Marginal por Monsanto. Queimo tristezas a um euro e tal o litro. Acelero por estradas estreitas, desertas. Quase consigo imaginar que estou na Serra, onde a vida parece sempre mais fácil. Pergunto-me, pela milésima vez, quando acabarão as minhas tendências auto-destrutivas. Mantenho o controlo do volante. Acelero quando me aproximo de uma curva, apenas para poder travar, reduzir uma mudança. Queixa-se a caixa de velocidades. Porque tenho sempre de bater no fundo antes de perceber por onde quero ir? Sei onde falhei. Sei que erros não posso voltar a repetir. Não agora. Regresso ao ponto de partida e volto para trás. Round and 'round and 'round it goes. Acendo cigarro, atrás de cigarro. Esta viagem bem podia ter o patrocínio da tabaqueira. O que vale mais? Os gestos ou as palavras? Agora, e pelas piores razões, sei a resposta. Acendo os médios. O dia aproxima-se do fim. As estradas de Monsanto estão vazias. Não se vê vivalma. Acende-se a luz da reserva. Volto para casa antes que o carro decida parar num qualquer canto escuso. Também não seria má ideia pedir patrocínio a uma petrolífera. Menos, menos ais. É disso que a minha vida precisa!

domingo, julho 30, 2006

Desabafo do dia

Amem-me. Odeiem-me. Mas não me ignorem.

[Eu não engulo sapos! Fazem-me azia. Mas à conta desta já comi uma embalagem inteira de strawberry cheesecake]

sábado, julho 29, 2006

Diário de Bordo II - Carcassone

Escrevo na estrada no banco de trás de um Audi qualquer coisa. Acabámos de atestar na estação de serviço de Carcassone e vamos a caminho de Montpellier. Esta auto-estrada tem verde por todos os lados e chegámos a ver o mar quando atravessámos o País Basco.

Foi difícil acordar hoje, mas eu e o lourinho já acertámos contas com o sono e dormimos uma soneca. O Jota e a SB é que não pregaram olho. A SB tem um bebé na barriga... mas vai aqui com a mesma força que qualquer um de nós.

Tenho rede na estrada o que é óptimo para actualizar este diário. Já li um montão de histórias infantis, cantei ao som do Cid e do Marco Paulo, do Paião e da Lena d'Água... Também já iniciámos uma sessão de Trivial, com regras própias para uma viagem como esta.

Até agora, tudo bem. Mas ansiosos por chegar.

Diário de Bordo I - Guarda

A torneira da banheira pinga insistentemente. O Hotel é antigo e até o lavatório tem ferrugem junto ao ralo. Se viessem a este quarto, o 319, mais vezes, percebiam quanto dinheiro estão a gastar em água. Há toalhas lavadas. Isso basta-me.

Mas este quarto de rés-do-chão deve ser apenas para turistas como nós, chegados às duas da manhã sem lugar para dormir, sem planos e de surpresa. Com os olhos feitos nos Pirinéus, e rodados quase 400 quilómetros, passamos aqui a nossa primeira noite, dois quartos, lado-a-lado. Quatro pessoas e um projecto.

A minha cama tem o cobertor que não deix passar em vão a fama da cidade dos três 'F': Farta, Fria e Forte. Na do lado já dorme o meu loirinho de 4 anos. Pediu-me uma história pelo caminho mas a escuridão ocupou todas as letras dos muitos livros que trouxemos. Amanhã há leituras, na certa. Hoje ficámo-nos pelas músicas do Marco Paulo tocadas no rádio do carro depois de uma rigorosa selecção, antes da partida. Tenho música deste género para mais uns mil quilómetros! Nada que nos adormeça.

Faltam menos de cinco horas para acordar. Vai ser uma jornada dura, amanhã, e eu já não me levanto antes das 11h há muito tempo. Vai custar...

E se o sono não chega, como agora, será pior ainda. Tudo bem. Tenho autorização para dormir em andamento. De qualquer maneira, se voltar a passar o 'Ninguém, Ninguém', a voz não me vai deixar pregar olho. E mais hits virão...

Vou sonhar com a Anita. Na quinta ou no Ballet?

sexta-feira, julho 28, 2006

Adultério [II]

Querida Júlia,
É verdade, sou adúltero, o que se há-de fazer? Sou adúltero como outros são coxos ou míopes; quero dizer, é uma coisa que foge ao meu controlo. Sinto muito. Talvez não acredites, mas se existisse um remédio ou uma cura para isto eu submeter-me-ia com todo o prazer. O adultério, ainda que dê muitas satisfações, acaba por ser esgotante, porque obriga as pessoas a viverem num estado de vigilância permanente.

De qualquer maneira, o que mais me surpreende quando recordo a nossa história é que me abandonaste pela mesma razão por que tinhas ficado comigo: por ser adúltero. [...]

Digo-te isto tudo porque estou a pensar em casar-me novamente com a minha actual companheira, a médica legista, pois gostamos muito um do outro e queremos formalizar a situação. Ou seja, tenho em perspectiva um casamento estável, sólido e, portanto, uma situação excepcional para me dedicar ao cultivo da paixão adúltera. O que queria propor-te é que a compartilhasses comigo, aceitando finalmente que se trata de uma relação sem horizonte, como a própria vida, mas, também como a vida, imprevisível e grandiosa. Se estiveres de acordo, escreve-me para o apartado dos correios que te indico no envelope, e negociamos.


Contos de Adúlteros Desorientados, Juan José Millás

Saudades

Bebem-se os últimos minutos do dia com sabor a caipirinha. Resquícios de açúcar amarelo que deixam na língua o travo amargo das limas. A noite vai alta. O calor acumulado perde-se no sussurro do vento. Só a discussão aquece. Sobe de tom a voz que se quer baixa, para que não entre nos sonhos dos que já dormem. Sorvo mais um golo. Penso que os dias têm corrido devagar. Calam-se as conversas. As luzes da casa apagam-se aos poucos. A água corre no lavatório. Fico só. Com o som das férias grandes. Vozes de miúdos que se confundem na noite. A cabeça mais leve. Pés descalços no frio da relva. Descarrego para o computador um giga de brincadeiras, gargalhadas, jogos de bola, banhos de mar, mergulhos de piscina, brindes de aniversário, o jogo de esconde-esconde com o G., birras de putos, corridas na areia, toldos vazios, a praia deserta... Mais do mesmo. Sou feliz assim. Os dias correm sem pressas. Só eu tenho urgência de voltar. Chegar a casa. Regressar para o que isso representa por estes dias.

Amanhã compramos um elástico!

quarta-feira, julho 26, 2006

Da praia

Acordo cedo. Demasiado cedo para quem está de férias. O riso do G. invade-me os sonhos. Viro-me para o outro lado. Tento dormir, nem que seja mais cinco minutos. Agora é o barulho da máquina do café. As colheres que batem contra as chávenas. Rendo-me as evidências. Desço do beliche aos tropeções. Daqui a meia hora estamos na rua. Baldes, toalhas, pás, bolas, o chapéu de sol. A descida para a praia demora um tempo infinito. O G. para de cinco em cinco metros para apanhar folhas. Se for como ontem, à volta serão pedras. Grandes e pequenas, que se acumulam nos sacos, dentro dos baldes. Pedras que vamos deitando fora sempre que o apanhamos distraído. Chegamos a praia quando a maior parte das pessoas ainda está a acordar. Volto a ser criança. Transporto baldes de água para fazer uma piscina. É bom ser criança de novo. É difícil estar cinco minutos deitada na areia. O livro esquecido dentro do saco. Uma história de obsessões que me deixa demasiado ansiosa. Empilhamos areia para construir castelos que decoramos com 'peixes' e conchas. Guerras de água. Batalhas de areia. O sol que vai alto e começa a aquecer. Mais um mergulho. O último antes do almoço. Saímos da praia quando os outros começam a chegar. Subimos no sentido contrário ao ‘trânsito’. Voltaremos mais tarde. A tempo de ver o sol desaparecer no horizonte.

Daisy

Pegou-ne na mão com força e esperou que atravessássemos juntas. A rua era estreita mas as matrículas deconhecidas, do país do lado, não deixavam enganar: estávamos num lugar estranho, e ninguém conhece o que nunca viu. Por segurança, apertou-me mais a mão e só me largou do outro lado, passeio estreito, sombra a deambular nas nossas cabeças, calor insuportável.

Chamo-lhe Daisy porque assim escreveu a rapariga do Starbucks Café quando teve de lhe identificar o copo de sumo de laranja natural. Desenhou depois o rato Mickey como se as duas personagens da Disney fizessem realmente par. Mas a minha Daisy sorriu com a brincadeira e ainda ganhou um balão, cheinho, para trazer na mão, pelas ruas que então conhecemos.

Era o início de Julho. Fazia calor em Sevilha.

Coonversámos sobre tudo, mas sobretudo conversámos. Passeámos à toa, a pé ou em transportes que a todos os lados nos levavam, mesmo que sem destino fôssemos. Aconteceu irmos parar a um Carrefour onde ainda comprámos iogurtes e pão, como se já vivêssemos naquela cidade desde sempre. Era assim uma espécie de Amadora, onde a morada serve apenas para dormir e receber cartas de pagamentos.

Agarrou na minha mão com força quando subimos à roda gigante. Nunca tinha andado numa e a altitude pareceu-lhe assustadora. Mas descansou à medida que subimos, e quando já se sentia à vontade rodopoiava na cabine e fotografava o mundo à nossa volta. Daisy estava a perder receios. Eu ganhava uma companheira para os meus gostos.

Daisy é tão doce como o mel. Doce no sorriso, nas palavras, nas brincadeiras de criança: canções que entoa sozinha, caricaturas de Floribella, passos de bailarina de improviso. Sonha acordada e à noite, por vezes, acordou-me com o seu sonhar. Às vezes sofria. Mas quase sempre dançava. Daisy é assim. Não pára. E gostava de a ver dormir.

A minha mão foi ainda apertada mais vezes, já na Ilha Mágica onde percorremos um mundo de aventuras mais juvenil. Quis mostrar-me a valentia e arriscou quase tudo. Tremeu, no comboio fantasma; arrepiou-se, nos rápidos rio acima; fechou os olhos na Anaconda, uma montanha russa onde a água nos entra pela casa dentro. Mas nunca desistiu. E acabou sempre a sorrir.

Daisy tem um sorriso lindo. Cheio. Daqueles que basta olhar uma vez para nunca mais esquecer. tem 9 anos, mas conquista as idades que lhe aparecem à frente... sem beicinhos, sem gracinhas, sem mordomias. Daisy é uma criança a saber crescer.

À noite, também de mão dada, pedia-me que lhe cantasse uma canção - aquela de quando eu era pequenina - e eu cantava até ouvir o respirar suave de quem já fechou os olhos por mais uma madrugada. Daisy não sabe que ainda é pequena para mim, mas vale o maior de todos dons. É um bocadinho minha.

terça-feira, julho 25, 2006

Regresso

Podia voltar a ser o que era...
Feliz.

Mais sexo nesta cidade

Oitenta e um por cento dos homens portugueses diz-se adeptos das aventuras de uma noite... daquelas que nem dão tempo para um pequeno-almoço a dois.
Uma classificação imbatível a nível mundial... os lusos ficam à frente dos brasileiros, e dos australianos.

Mas Portugal também tem bons resultados no cavalheirismo... numa relação sexual mais de metade dos portugueses deseja acima de tudo o prazer da mulher... número só superado pelos indonésios.

As conclusões vêm no estudo de uma revista internacional que avaliou o tema sexo em 40 mil homens de 42 países.

Mais a par da média mundial... 51 por cento dos portugueses garante ser fiel... categoria ganha por polacos e alemães.

Portugal perde sim, na criatividade sexual... 4 posições por relação sexual... apenas metade das experimentadas pelos húngaros.
E perde também no desempenho. Em média os portugueses não aguentam 20 minutos até ao climax... os mexicanos vencem com 23 minutos.

Globalmente, a maioria dos inquiridos - 84 por cento - pratica sexo na cama, mas 57 por cento já experimentou no carro, 51 por cento na cozinha e 41 por cento num bosque... em percentagens muito menores... há quem tenha tido relações sexuais em transportes públicos, taxis e aeroportos.


IN Jornal da Noite - SIC

Adultério


Passo a Ponte de comboio. Mantenho-me junto à porta enquanto o Rio corre lá em baixo. Volto para o lugar quando chegamos ao Pragal. É uma viagem nova. Pela primeira vez desço ao Sul no meu transporte de eleição. Lembro-me de outros caminhos. Viagens em que me sentei à porta do comboio. O braço entrelaçado no corrimão. A curiosidade, a vontade de absorver tudo, que se sobreponha ao medo. Maior que o vento que me cortava a respiração e que me obrigava tantas vezes a olhar para trás. Engolir o ar em golfadas urgentes, para poder de novo virar a cabeça para a frente. Lembro-me da subida do Tua. Um comboio vermelho centenário, sobre uma escarpa ameaçadora. Pouca-terra-pouca-terra-pouca... Todos os anos prometo a mim mesma que vou voltar. Antes que fechem a linha. Mais uma no mapa do esquecimento. Estou longe desse Rio. Estou ainda mais longe desses dias de angústia. Vou para Sul. Janelas fechadas para conter o ar demasiado frio. Nem uma nesga para deitar a cabeça de fora. Nem uma porta para abrir em andamento. Aos poucos afasto-me da paisagem. Olho sem ver. De tempos a tempos reparo no castanho dos campos, aqui e ali sarapintados pelo verde dos sobreiros. Olho sem ver e acabo por me entregar ao adultério... Posted by Picasa

segunda-feira, julho 24, 2006

Imagem

Sentei-me na cadeira negra que sobe e desce conforme quem se lá senta. Fechei os ohos e senti o pó comer-me a cara, deslizando primeiro nos olhos, depois nas faces, amortizado com ums esponjinhas suaves e umas mãos ainda mais delicadas.

Mantive-os fechados e fui ouvindo os comentários, ao mesmo tempo que, na tv, passava mais uma notícia sobre a Guerra entre Israel e o Líbano. Ali estava eu a ouvir o barulho do conflito, a sentir o pó dos bombardeios, a sentir as movimentações das tropas... e à minha volta também alguém se movimentava. E continuava a tocar-me com paninhos de lã.

- Abre. E abri-os, olhando para o tecto. Não vi nada e tudo me pareceu tremido; até a caixa do ar condicionado. Baixei o olhar e as pestanas foram esticadas, enegrecidas. Pisquei os olhos, nervosa e desconfortável. Já estava quase... Tentei encarar o espelho em frente mas não vi nada, mais uma vez. O olhar traiu-me e as cores misturaram-se com a minha miopia. Não vi que já estava outra pessoa, rodeada de reflexos de mim própria por todos os lados.

Quando saí da sala de maquilhagem toda a gente olhava para mim. Os comentários eram positivos, mas eu sentia-me uma criança de sete anos com unhas pintadas de cor-de-rosa. Estás tão gira, dizem-nos. E acreditamos por fora, sem sentir que somos nós, cá por dentro.

Tirei a fotografia que precisava para a página da empresa na net e voltei para o meu lugar.

Escrevo este post com um brilho nos olhos. Mas que vai sair mais tarde, quando passar um creme desmaquilhante e uma boa dose de água pela cara. É que este é o único brilho que eles têm visto, nos últimos tempos. Vou demorá-lo até à hora de dormir.

sexta-feira, julho 21, 2006

Afectos [II]

Conta-me estórias de amor. Hoje quero adormecer ao som da tua voz.

Fim-de-semana

Antecipo com pressa o fim-de-semana.

Ter chegado de um mês inteirinho de férias não me fez sossessar e tenho agora mais vontade de sair, voltar para casa, sair daqui, largar o teclado e o computador, e os afazeres e as reuniões...

Esta semana foi dura. Não porque o trabalho tenha sobrado. Fez-se à medida. Mas porque me falta aquela pressão dos dias que não são de Verão, aquela sensação de que 'não vai dar tempo', sabendo muito bem que tem de dar. Não gosto que o tempo sobre aqui... porque resisto a aproveitá-lo noutro lado. Fico com complexos e mantenho-me de login aberto à espera que caia o mundo. Mas o meu mundo já caiu, esta semana. E só vai reeguer-se no próximo dia 30, quando voltar a estar de férias!!!!

quinta-feira, julho 20, 2006

O tempo tem....

/O tempo perguntou ao tempo, quanto tempo o tempo tem; e o tempo respondeu ao tempo, que o tempo tem tanto tempo, quanto tempo o tempo tem./
Houve alguém que me ensinou isto na minha meninice, mas embora seja um bom destravador de língua, não é lá muito verdadeiro. A elasticidade do tempo é algo inversamente proporcional aos meus estados de espírito. É só eu estar com ganas de fazer uma data de coisas, para nesse dia não ter tempo para nada. Depois vêm os momentos mortos, que podiam ser preenchidos com milhentos escritos, telefonemas, cozinhados e caminhadas, e não há há pachorra nem para mexer o dedo mindinho. A este propósito, no outro dia, assustei-me com o meu horóscopo (sim, lembram-se que um dos meus posts - que se conta pelos dedos da mão - foi sobre isso) e suas previsões. Dizia que por causa de um acontecimento inesperado eu ia passar a dar importância a cada minuto da minha vida. Fiquei um bocado em pânico, porque pensei logo numa desgraça. Espero que o cosmos não me reserve nada assim tão grave. Eu prometo fazer um esforço para melhor usar o tempo que o tempo.

E ainda mais...

Ainda Sevilha...

Insónia

- Toma um comprimido para dormir, disseram-me ao telefone.
- Não quero. Habituo-me. E isto também há-de melhorar, quando a enxaqueca me largar.

Mas penso agora que talvez não. Não, porque as insónias continuam a fazer parte das minhas noites, juntamentente com as noites mal dormidas quando finalmente adormeço. Ou há-de ser uma coisa, ou outra. Já falei disto aqui, uma vez...

É à noite que me chegam todos os pensamentos de um dia, de uma vida, de um passado. É à noite que descubro tudo o que não fiz, tudo o que não planeei, tudo o que correu mal, tudo o que não evitei, tudo e mais alguma coisa, mas apenas o tudo que me descontrola, me faz mal, que me faz perder o sono. 'A noite é boa conselheira', dizem. Sim, se a temos. Mas se ela se torna dia, que conselhos nos dará?

A noite podia ser mais longa, para podermos aproveitar a parte que não dormimos, nós, os preocupados; nós, os que não deitamos a cabeça descansada na almofada; nós o que achamos que às três da manhã ainda não é tarde para adormecer, nós os que vemos na noite uma parte do dia que é tão clara como qualquer manhã.

Perceber-me-á quem, como eu, sofre destes incómodos nocturnos, que se revelam na manhã seguinte com a dificuldade de acordar, com os olhos pesados, com a dor nas pálpebras, com as pernas cansadas... E se vivesse noutro fuso horário? Talvez estivesse melhor do outro lado do mundo. Ou talvez seja o meu mundo que continua ao coontrário.

Ou talvez seja melhor criar hábitos, de uma vez por todas, para estas malditas insónias atenuarem. Para poder descansar quando tudo pára, quando já ninguém pode falar comigo ao telefone, quando só um blog serve para despejar os meus pensamentos, quando só um blog serve para fazer de conta que estou acordada porque tenho tanto para dizer.

Não tenho nada, como se lê. E tenho quase tudo... misturado na minha cabeça.
Direi 'até amanhã'?

Israel

Expliquem-me como se eu fosse uma criança de 4 anos:
Porque é que Israel tem de estar sempre nas primeiras páginas, pelos piores motivos?

E eu que gostava tanto de um dia ir lá...

Enxaqueca

Tento espantá-la, neste post.

Chegou sorrateiramente, durante a tarde, e tomou-me o lado direito das costas e da cabeça. O direito. Felizmente (?) já não escrevo só à mão e não fiquei impedida de todos os movimentos, no computador.

Quando vi que cavalgava levantei-me e saí. Mais cedo do que o normal apanhei a A5, depois a CREL; já quase sem abrir os olhos.

Ela ria-se de mim por, até àquela altura, ainda não ter tomado a dose que iria dominá-la. Eu sentia-me cansada e sabia que as últimas noites, mal dormidas, e um envelope das finanças que recebi de manhã estariam na origem da dor. Pensei que a cama resolveria o meu problema e foi para lá que me atirei mal cheguei a casa.

Enganei-me. Aquela dor latejante queria mais do que repouso. Queria mais do que um colchão ortopédico, mais do que uma almofada colunex que se adapta à forma do pescoço. Foi por isso que se tornou mais violenta e veio pedir-me droga...

Dei-lhe um Migretil perto da meia-noite. Atenuou e agora mantém-se alerta só para garantir que não dou um passo em falso antes que vá embora de vez. Espero por isso.

E deixo neste post a dor de não poder contrariá-la mais cedo, a essa enxaqueca que teima em vir quando a vida não corre como o planeado.

terça-feira, julho 18, 2006

Pelo correio

Não é uma carta de amor, mas foi uma surpresa boa. Agora tenho um 'smile' em tamanho gigante a olhar para mim...

[sem] Palavras

Há silêncios que não matam, mas moem.

domingo, julho 16, 2006

Palavras*

Há palavras que pesam como chumbo. Deixam marcas que nem o tempo apaga. Que nenhum laser fará desaparecer. Ficam tatuadas num qualquer músculo. Magoam. Há também as que nos deixam quase indiferentes. Pequenas plumas. Deixam na pele uma ligeira impressão. Mas não mudam nada. Se não tivessem sido proferidas os dias continuariam iguais. Há palavras que pesam como chumbo. Que devem ser medidas e pesadas, ao miligrama, antes de serem arremessadas. Palavras doces, numa espécie de oração. Uma 'ordem' para seguir em frente. Um esconjuro de fantasmas e tristezas. Há palavras que são perfeitos beijos na boca. Não é preciso mais nada. Palavras que a brisa junto ao mar não leva. Que ficam. Sentidas e com sentido. Está dito, está dito. E o mundo continua a girar. "'Round and 'round and 'round it goes. Where it stops only i know".

[ou post delicodoce, na designação de um blogger de referência]

Primeiro Amor

Preciso urgentemente de saber:

Há mais amores como o primeiro?

sábado, julho 15, 2006

«Não tenho sorte nenhuma»

A tarde quente deste sábado levou-me ao Piazza di Mare. Acompanhada pelo Rei que gosta de mordomias e não se contenta com pouco. Granizado de melão a acompanhar uma tosta fizeram, às seis da tarde, o menu do meu almoço num hábito que se vai arrastando; o de não comer refeições certas e a horas. Depois, a loucura de que já aqui falei, neste blog - e mais uma fatia de cheesecake para a barriguita que começa a ganhar forma. Não é uma gravidez, mas um caso grave de dependência cheesecakeriana.

De consciência pesada - e não só - disse ao Rei para irmos passear. Mas sua Majestade não gosta de mexer o rabo e acabei por ir sozinha. Fiz 20 minutos a pé, num bom andar, à beira-rio. Foi quando ouvi um piropo que por pouco confundi com motivos profissionais:

Ao passar por dois pescadores, diz um deles: 'Só eu não tenho sorte nenhuma'. Ainda pensei virar-me e ver se tinha o balde vazio, o anzol pendurado sem nada, a cana direita sem o peso do peixe que morde...

Só então percebi que o isco era eu. E sorri para mim, antes de voltar aos braços do Rei.

Vícios

Tenho mais um livro.
Não tenho onde pô-lo. Não vou lê-lo já.
Foi-me oferecido, este Hemingway. Mais um.
Tenho mais um livro que não sei quando lerei.
Tenho mais livros do que algum dia lerei (?).
Mas quero mais.
E tê-los faz-me sentir bem. Acompanhada.
Mesmo que só folheie três ou quatro páginas por dia, que há fases assim.
Tenho mais um livro. E é meu!

Topless

A bola rolou ao lado da toalha. Ela fez de conta que nada se tinha passado e manteve os olhos fechados, o brilho no corpo, o peito firme sem cobertura porque o topless lhe dava uma graça naquela posição de deitada. Eles, um grupo de rapazes mais acima, na areia, riam-se e gostavam de passar por perto para melhor ver a rapariga deitada de barriga para cima, cueca nos limites, unhas dos pés pintadas e uma pulseira no tornozelo. Tinha uma amiga, também ela em topless, também ela brilhante porque o bronzeador assim fez, também ela distraída, cigarro na mão, cinza na areia.

Havia mais grupos, mas menos ousados. Magras, altas, bonitas, com biquinis do tamanho de um corpo de capa de revista, sem anorexia, apenas idade. Menos de 20 anos. Mas a bola passava menos por elas.

A bola voltou a passar peerto das raparigas em topless. Uma delas levantou a cabeça. Puxou as fitas do soutien e atou-o antes de se levantar. Viu-se então um peito maior, quase descaído, e umas sobras na barriga que não acompanhavam o perfil. A outra também se levantou. Também ela apertou o soutien porque o topless, nas mais novas, faz-se tímido e deitado. Olhou de lado para os rapazes que mantinham os risinhos e uma ou outra observação do tipo 'às minhas seis horas'. E todos tentavam acertar o pensamento com os ponteiros do relógio para ver que novidade tinha chegado à praia.

Os olhares cruzavam-se aqui e ali e os surfistas saíam do mar de corpo bem feito, fato de neoprene meio despido, cremes espessos passados no rosto. Um verdadeiro ambiente dessas novelas que por aí agora proliferam. Morenos e de cabelos compridos, sorriso brancos juventude em marcha.

Virei os meus 33 anos para cima, composta, e pus um chapéu a tapar-me os olhos. Tentei não ouvir as chamadas para casa a pedir para ficar 'só mais um bocadinho' e evitei entrar naquele mundo que já terá sido meu um dia.

Não na Praia do Sul, na Ericeira, mas noutro sítio qualquer...

Divã XIII

- Não devíamos estar de férias, Doutor?

- Tem deixado de pensar, agora que é Verão?

- Não.

- O Divã só pára quando o pensamento não existe. E isso é impossível. Deite-se lá...

Sevilha. A Ilha Mágica

Entrámos de mãos dadas seguras de que estávamos prestes a partilhar perigosas aventuras. Passado o torniquete, a minha desilusão e a emoção dela, própria de uns 9 anos sempre à espera de mais e sem lugar para decepções desnecessárias.

Estávamos na Ilha Mágica. O sonho dos dias anteriores concretizava-se e isso era o importante.

A Ilha Mágica pareceu-me um carrossel quando comparada com a Disneyland Paris, por exemplo, mas avancei confiante nos panfletos que já tinham lido e que diziam dela ser um espectáculo. De qualquer forma, quase 40 euros depois, já não voltaria atrás, ou teria a minha consciência a dar-me cabo da cabeça. E a minha companheira também.

Fomos por instinto naquele lugar parecido em muito com as localidades portuguesas e a sua falta de sinalização. Chegámos a uma zona infantil que a minha amiga não dispensou. Saltou mais alto que o sol - que já pesava nas nossas cabeças, por essa hora - nuns trampolins gigantes e explorou uma parede como uma verdadeira alpinista. Eu limitei-me a fotografar os momentos e a ver nascer em mim o orgulho de vê-la subir mais alto que um calmeirão que, ao lado, trepava deitando os 'bofes pela boca'.

Chegou o meu momento e não dispensei nenhuma das diversões para adultos. Desde a vertiginosa montanha russa, à torre de 68 metros de queda livre, passando pela barcaça que gira sobre si e anda de lado em lado numa correria que nem um barco a motor conseguiria bater.

Voltámos a juntar-nos para o passeio dos medos, uma espécie de comboio fantasma onde morreram piratas - porque estamos numa ilha - a da Cartuja, que em 1992 foi lugar de uma Exposição Mundial - piratas e reféns que agora nos aparecem feitos esqueletos, mas que só assustam a minha companheira. Nada que um braço amigo não resolva no instante.

Fomos depois à aventura pela montanha Anaconda e não esquecemos os rápidos; diversões feitas de água que nos deixaram encharcadas quando, na rua, a temperatura já teria ultrapassado os 40 graus.

Valeu a pena atravessar a Barqueta para chegar àquela ilha. Não tão mágica como esperava, mas suficiente para imprimir magia nos mais novos que ali entram. E eu tinha um trunfo.

Não posso terminar este post sem fazer um elogio ao belíssimo e fantástico filme sobre uma Mansão Maldita. Visto em 3D fez-nos entrar com o terror e os receios que outros seres representados por nós também sentiam. O rato que seguimos, o tapete que se levantava nas nossas caras, em forma de felino, os esguichos de água de um sopro de cascavel... Enfim, realidades virtuais que fazem da Mansão uma casa parar temer e respirar de alívio porque afinal... basta tirar os óculos para voltar à realidade.

sexta-feira, julho 14, 2006

Acordar

Acordei virada do avesso. É a segunda noite mal dormida. É sempre assim depois de uma insónia. Acho que a história se vai repetir. Não vou pregar olho. A cama vai acabar transformada num campo de batalha. Mortos e feridos espalhados pelo rosa dos lençóis. Nem me aproximo do quarto. Arrasto-me pela casa com medo de deitar a cabeça na almofada. Converso sobre livros. Vou fazendo zapping na televisão. Olho sem ver. O cinzeiro cada vez mais cheio. Está calor. Muito calor. Passo do sofá para o tapete vermelho. Acabo na banheira. Água tépida em tons de verde. Cheira a SPA. Os quadradinhos da L’Occitane fazem-me sempre pensar na Quinta das Lágrimas. Faltam as mãos que, no local em que Pedro e Inês morreram por amor, me desfizeram os nós que o peso do mundo me deixa nos ombros. Seco-me às escuras. São dois passos até ao quarto. As luzes da casa apagadas. Não quero espantar o sono. Adormeço em dois tempos. Acordo, tarde demais, virada do avesso.

quinta-feira, julho 13, 2006

Até já

Eu, que maldigo as greves nos transportes, as baldas na função pública, as faltas dos professores, as manifestações de agricultores, as concentrações estudantis, aplaudo, de pé, a greve na gráfica que imprime o pasquim. Não me interessa se querem aumentos de salários. Mais uma pausa para o lanche. Mais luz natural na oficina. Não quero saber dos deveres que não cumprem. Dos direitos que não têm. Por causa deles, hoje fechamos o jornal cinco horas mais cedo. O sol ainda está para ficar. Tenho tempo para tudo. Como merecem os dias de Verão. Troco os saltos por havaianas. As calças de ganga por uns calções bem curtos. Por baixo o biquini branco que me faz sobressair o bronzeado. Entro no carro e ponho a música no máximo. Vou enterrar os pés na areia. Ver as ondas roçagar a areia dourada. Mas vou sobretudo ouvir o murmúrio do mar num fim de tarde que se quer doce. Até já.

quarta-feira, julho 12, 2006

Dias de remanso

Dias de vento, de sol envergonhado, de caminhadas e de muita leitura. Camarões, atum, bacalhau, salmão e outros frutos do mar. Noites bem dormidas. Conversas gostosas. Um certo alheamento do mundo que a tecnologia nos despeja quotidianamente. São dias que correm doce, leve, suavemente. Alguns só na companhia dos meus botões, com quem converso distraidamente. Notas num caderno a preparar um regresso para os planos que sempre venho adiando. Promessas de novas rotinas, de maior cultivo das amizades. Estas quatro semanas de férias permitem cumprir mais uma das etapas do calendário (com o aniversário e a passagem de ano) em que me reinvento e penso que se abre mais uma página em branco. Para começar tudo de novo, melhor, sem medos. Como o mar, que parece ser sempre o mesmo mas que sempre se renova em cada onda, eu procuro refrescar-me interiormente, sabendo que no fundo há muita coisa que é de natureza permanente. Não há volta a dar: adoro balanços. O deve e o haver deste trimestre não é muito equilibrado mas no Verão o azul e o dourado dão-me alento. Ainda estou em pause e rewind, mas em breve será tempo de voltar ao play. Até lá, vou aproveitando os dias de remanso.

Da importância de uma escova de dentes

Hoje queria escrever sobre a importância de uma escova de dentes. Na protecção da privacidade das partes envolvidas remeto-me ao silêncio.

terça-feira, julho 11, 2006

Sevilha. A viagem.

Estava demasiado quente em Sevilha o que obrigou, diariamente, a uma siesta. A capital Andaluza não perdeu, no entanto, o encanto de uma cidade com raízes e muita História. Mesmo nos momentos de olhos fechados.

O Guadalquivir mostrou-se calmo e não impediu travessias como a que um dia se fez, para uma tal ilha, Mágica, antes Cartuja, à procura de emoções fortes e cheiro de piratas. Mas sobre isso falaremos mais tarde...

As ruas de Sevilha estavam cheias. Dia e noite, à semana e nos dias de descanso. É que as rebajas chegaram às montras e o entra e sai fazia-se de sacos na mãos, com os vermelhos, os do El Corte Inglês, a sobrepôr-se aos outros, de lojas de roupas e tantas de sapatos, que ninguém anda descalço em Sevilha. Parece uma população feliz e criativa. Veste a rigor e passa na rua a moda recente para contrastar com as marcas da História, ora coloridas - como os multicolores azulejos - ora cinzentas de pedra, ou castanhas, como os monumentos que a UNESCO já classificou como Património da Humanidade: a Giralda, a Catedral, ou o Alcázar...

Foi este último que visitámos à noite. Foi edificado por volta do ano 900, e desde então são visíveis as alterações e as influências dos que por lá já passaram. A visita nocturna permitiu conhecer um pouco dos hábitos mouriscos, e entrar ali, de música de fundo a embalar, cheiro a insenso e azulejaria de mil cores a contrastar sempre, umas e outras, como se quem veio depois, apenas tivesse completado o gosto de quem já tinha saído.

Sevilha é ainda calor porque as gentes assim o querem. O castelhano ouve-se bem alto e o abocanhar das tapas e dos bocadillos não engana: estamos em Espanha. No centro da cidade as Bodegas deixam sair cheiros de refeições rápidas e variadas, que correm numa espuma de cerveja que só a temperatura pode compreender. E levantam-se toldos para tapar o sol, que as cabeças, cá em baixo, andam descobertas, bem como as carteiras que os mais distraídas deixam roubar. Assisti a uma fuga de bicicleta, já o larápio pedalava rua fora com o assaltado a correr atrás, até desistir porque as pernas não andam como as que têm raios e rolam entre quem passa distraído e habituado ao acontecimento.

Gostei de Sevilha. Até entrei na Praça de Touros, apesar de não concordar com o que ali se passa. Mas se a História da cidade passa pela Maestranza, como contorná-la? Já agora, fica a lenda Joselito, rapaz que aos 4 anos já toureava e aos 14 já matava o touro na arena. Famoso, carreira promissora, novo... suicidou-se aos 25 por amor. O corajoso Joselito, matador reconhecido, não deixou de escolher para si, um fim tão fatal como a fatalidade da paixão não correspondida.

Haverá mais, de Sevilha.

Manhãs

Agora, de vez em quando, há manhãs que dão para tudo. Dias em que acordo mais cedo. Que oiço a TSF ainda antes de começar o Fórum, que apanho mais trânsito, que não tenho direito a lugar no metro. Acordo cedo com os barulhos que vão sendo cada vez mais familiares. Acordo com o ruído do estore a abrir. Do esquentador a disparar. Viro-me para o outro lado. Enrolo a almofada por baixo da cabeça. Convenço-me que vou dormir mais uma hora. Nunca durmo. Faço ronha por mais dez minutos. E depois a manhã dá para tudo. Para tomar o pequeno-almoço com calma. Subir o Chiado lentamente, quando as ruas estão ainda a meio gás. Espreitar os saldos quando as lojas ainda estão vazias e ainda não parecem a Feira do Relógio. Aproveitar o cheiro doce das manhãs de Lisboa. E chegar ao pasquim antes de toda a gente. Fico aqui sentada num semi-silencio, invadido pelas camionetas das cargas e descargas que vão passando na travessa. Leio os jornais de uma ponta à outra. Faço a ronda dos blogs. Escarafuncho as estatísticas. Sinto a falta de alguns leitores. Presumo que voltem um dia destes, ou que tenham passado as visitas para mais tarde. Vejo os mails. Respondo a uns, mando outros directamente para o lixo. As manhãs dão para tudo e o dia parece que nunca mais vai acabar.

segunda-feira, julho 10, 2006

domingo, julho 09, 2006

Arrumações

Arrumo o passado em grandes folhas negras. Instantâneos de outros tempos. De outras vidas. Uma varanda com vista para o Pico do outro lado do Canal. Apanho margaridas cor-de-rosa. As mesmas que depois prendo no cabelo. Sempre com um sorriso. A areia negra das ilhas que me escapa por entre os dedos. O mar a bater violentamente contra as escarpas. A atracção do perigo. Olho para estes momentos de uma forma diferente. Há um ano, quando os guardei dentro uma caixa, não tinha ainda lido ‘as duas águas do mar’. Só hoje me apercebo das nuances criadas pelas imagens do livro. Eu, sentada à porta de um museu que nunca abriu, espreguiçando-me. De perfil. Sempre com um sorriso. O azul da camisola é a continuação do céu e contrasta com o verde da relva. De costas para a objectiva, na contraluz do dia que termina. O mapa meio dobrado no tablier do carro. Um moinho vermelho sobre o atlântico. Só os olhos não riem quando levo a mão ao cabelo. Um barco ancorado no cimo de uma escarpa. Longe do mar, longe de tudo. A travessia do canal com o céu pintado pelo dourado do pôr-do-sol. Vacas indolentes em pastagens verdejantes. Campos da bola sobranceiros ao mar. A terra vermelha junto às vinhas. O cume encoberto por um nevoeiro cerrado. Os olhos não riram nesses dias passados no meio do oceano. Era o princípio de uma nova vida. Mas era também o fim. Arrumo o passado em grandes folhas negras no dia em que percebo que há coisas nesse passado que me fazem falta.

sábado, julho 08, 2006

Ainda o aborto... [II]

Vidas de cão

A Clara ia fazer, dia 8 de Agosto, 25 anos. Alegre, sempre alegre. Terminou o curso e começou a trabalhar. Vivia há seis meses com o namorado e tinha o casamento marcado para Março de 2007.

A Clara ficou grávida há pouco mais de um mês. Ela e o Paulo conversaram sobre o assunto e, nesta fase, ambos a iniciarem as suas vidas profissionais, um bebé "não vinha nada a calhar".

Foram os dois a uma parteira conhecida de uma amiga, para a Clara fazer um aborto.

O funeral da Clara foi há dois dias.

Podia aqui escrever imenso acerca deste assunto. Sinceramente, neste momento não me apetece. Esta notícia chocou-me tanto, mas tanto, que vou aguardar que o nó na garganta me passe e, depois, retomá-lo-ei. Até pela Clara, por todas as Claras que ainda podem morrer neste país de hipocrisias instaladas.

Vergonhoso.


[in Cão Com Pulgas via Trafuncas]

sexta-feira, julho 07, 2006

Afectos

Gosto de te encontrar nas alturas mais improváveis. Nos sítios mais inusitados. Como agora. Saquei-te do meu saco de viagem, juntamente com o pijama.

quinta-feira, julho 06, 2006

Logo hoje...

... que não queria ouvir falar de futebol. Logo hoje que passei o dia a virar as primeiras páginas dos jornais da sala de fumo. Logo hoje, leio isto...

"e no coração as bandeiras desfraldadas ao vento. e a malta que grita. é golo, é golo é golo. o mesmo mar. os mesmos pescadores. e os braços que se me arrepiam. a rádio que grita. a tsf. sempre a tsf rádio jornal. aquela voz num sangue desbragado perdido ao vento. o jogo. o abraço do meu pai. o furor. o calor. e tudo isto aqui, também, diante do mar. as bandeiras desfraldadas ao vento. e a malta que grita. a festa em furor. é golo é golo é golo, é golo, é golo de Portugal. é golo de Portugal. o teu piano por dentro. um piano lento. e eu vejo tudo isto em câmara lenta. um piano que sobe. naquela voz em anéis de fogo. naquelas gargalhadas desmedidas. e por dentro daquele ser, a multidão enfunada na tua voz inesquecível. que bonito é. e de novo as bandeiras desfraldadas ao vento. e a malta que grita a festa. é disto que o meu povo gosta, dizias com todas as tuas veias. e de novo aquele aperto no peito. e o meu pai a ferver no sofá. e os punhos fechados. aguenta coração. aguenta coração. tal é o furor de ser o jogo, este furor de amar, de ser esta paixão dura e árdua no excesso de ser português. e poder chorar, e poder ser muitos. e poder ser toda a gente em toda a parte. e poder ser nada. e poder sentir tudo em toda a parte."

É desta que corto os pulsos!

O Mais Cidade voltou ao formato antigo. Não é de propósito. Desconheço mesmo porque raio desapareceu todo o código só porque tentei adicionar o Trafuncas aos linques aqui ao lado. Até chegar a casa, e confirmar que tive a inteligência de gravar em Word a template que me levou uma noite inteira a criar, fica assim. Enquanto isso, vou ali cortar os pulsos [sim, já sei, ponho um pano à volta para o sangue não esguichar muito…] e não volto.

Uma razão

Preciso de uma razão para não pegar no casaco e mandar tudo às urtigas.

quarta-feira, julho 05, 2006

Lições de vida*

"Meu amor, vou ensinar-te uma coisa: Pede. Não digas tenho sede quando queres um copo de água".

[* Ou eu ainda tenho tanto que aprender]

Beijos de Sevilha

Amanhã vou à Ilha Magica voltar a ser criança. Se não voltar, não estranhem. Muitos beijos, Samantha

terça-feira, julho 04, 2006

Desculpas...

...não se pedem. Evitam-se. Merda para a impulsividade!

Homenagem

Na minha vida existem quatro mulheres que são incondicionais. Além das três que comigo partilham esta Cidade, tenho uma irmã mais velha sem a qual não sei viver. Mas, nos últimos meses, uma outra vem ganhando uma dimensão crescente. Já aqui escrevi sobre ela. Hoje, um daqueles dias em que não percebo se estou zangada com o mundo, ou o mundo comigo, a sua companhia não só me devolveu o sorriso, como me fez soltar algumas gargalhadas que deixaram muita gente a olhar para mim. É uma mulher linda, de quem não consigo deixar de ter um ciúme estrutural. Junta-se o facto de ser uma mulher inteligente, que tem uma relação com a vida que, mais uma vez, invejo. Hoje voltei a perceber que tenho muito a aprender com ela. Qualquer coisa que pudesse escrever a mais seria sempre redutor. Ela é muito mais do que isso... Sabendo como sabes, que podes sempre contar comigo [sem horários, nem constrangimentos], quero ainda dizer-te que te adoro.

Dia não

Devia ter continuado na cama. Agora que vim, resta-me respirar fundo e esperar que o dia passe depressa.

domingo, julho 02, 2006

Solidão

Sou auto-suficiente. Seja a mudar um pneu, a transportar os sacos do supermercado, a mudar uma lâmpada, a pendurar um quadro, you name it. A minha independência é também emocional. Surpreenderam-me um dia ao perguntar se era uma pessoa solitária. Até essa altura nunca o tinha percebido. Mais tarde, a mesma pessoa perguntou-me se me dava bem com a minha companhia. Sim. Há tanta coisa que gosto de fazer sozinha. Já tantas vezes troquei a companhia, mesmo dos meus melhores amigos, por uma tarde ou uma noite de isolamento. Mas ontem foi diferente. A solidão ganhou uma dimensão física. Ocupou um espaço enorme dentro do meu peito. A casa demasiado vazia. Hoje reencontro-me no mesmo vazio. É bom estar comigo.