Sobre António...
O sorriso final enterneceu-me. Agradeceu. Mas eu é que tinha ganho com aquela conversa. Falou-me de Balzac e de Joseph Conrad, de África e dos dias de Angola, de ser quase menino e logo ter aprendido a usar uma arma pendurada no braço. "Escrever é como escrever", disse-me, e fixei a frase como uma das mais belas que já ouvi. Tão simples de bela que até aborrece. António é Lobo Antunes, este escritor que me deixa a ouvi-lo enternecida no olhar e no gesto sereno das mãos. Pernas cruzadas na ganga de umas calças já velhas e camisa aos quadrados, blusão, olhos muito azuis e cabelos grisalhos. Mais de vinte caixas de livros espalhadas pela garagem e um convite a levar o que quiséssemos. Livros que já leu, que repetiu, autores que não conheci, revistas dos anos 20 e 30. E páginas. Muitas para ler e folhear como quem ama um livro. António ama tanto os livros que quer que outros os leiam. Partilha, pede que se interessem, convida, incita. António convence-me com uma só palavra. Ele não sabe que eu, perante ele, fico sem contraponto, sem argumentos. Concordo. Deixo-me levar. Àquele país de palavras que António habita por toda a vida.
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