Greve Geral
Gostava de ter feito greve. Não queria ser funcionária pública, nem tão pouco aproveitar um fim-de-semana prolongado à conta de quaisquer reinvindicações. Gostava, simplesmente, de não ter trabalhado hoje. Serão muitos os que, como eu, tiveram hoje de levantar-se, desligar o despertador, tomar banho e pôr a chave na ignição ou apanhar o metro. Serão muitos os que não puderam, numa sexta-feira que, de manhã, me pareceu ter sol, ficar sossegados na cama por mais duas horas, tomar um chá numa esplanada ou ler o jornal na relva. Foram muitos. Mas dizem que 80 por cento da função pública pôde fazer tudo isto. Outros dizem que apenas 20 quiseram aderir à ideia. Eu não gosto de greves e não concordo com nenhuma. Mas hoje teria feito greve, se pudesse. Hoje teria dormido, teria aproveitado o dia fora da redacção, teria lido um pouco o novo Harry Potter (ainda nem comecei e apetece-me muito), teria estreado a minha máquina de imprimir fotografias. A cores. Mas não. Como numa sexta-feira normal vim trabalhar. E nem a enxaqueca matinal me fez desistir. Eu não gosto de greves. Já aqui o disse, não já? Dirão muitos que eu não sei o que é viver mal por causa do estado do Estado, que não sei o que é viver sob a égide governamental, que não sei o que é ter mínimos quando são exigidos médios. Enganam-se. Sei muito bem. As empresas privadas não oferecem melhores condições que o Estado e, nelas, temos de trabalhar mais. E não há cá concursos nem estudos que nos valham. Conta o trabalho, o empenho, a entrega e as horas que damos à casa. Greve? Eu queria fazer greve. Mas não concordo com nenhuma.