Entre a tristeza e a aparência
Parecia triste mas ninguém podia afirmar que realmente o estava. Tinha tudo para ser feliz: vivia numa bela casa com vista para o sol poente, tinha uma família adorável, um carro que a levava onde queria ir, um emprego que a estimulava e colegas agradáveis, daqueles com quem dá para beber copos à noite sem ter medo de beber um a mais. Tinha amigos. Dos bons. Dos verdadeiros. Dos que duram vidas no telemóvel e estão também na memória, para alguma eventualidade teclável. Tinha amigos que gostavam mais dela do que ela pensava... talvez mais do que ela gostava deles.
Parecia triste, naquele dia.
Mas já assim o parecera, noutras ocasiões.
E nesses dias de tristeza ninguém lhe podia dizer nada porque o certo era que lhe dissessem 'mas estás triste porquê?' e ela, furiosaa porque ninguém percebia, desaparecia e não dizia uma palavra.
Ficava ainda mais triste.
Não lhe adiantavam segredos e truques adiantados por outros: ir ver o mar, ler um livro, beber um café, trocar palavras com este ou com aquele. Não. A tristeza, ou o que aparentava ser aquele estado de alma, levava-a sozinha para casa. Não ouvia um disco, não folheava uma página, não comia uma cereja. Deitava-se ao largo da cama e não chorava. Não era capaz. Por isso também não sabia se estava , ou não, triste. E porquê.
A verdade é que não estava feliz, e isso bastava-lhe para se sentir triste. Daí à tristeza profunda deveria ser um passinho, não?
Aos olhos dos outros era feliz, por tudo o que tinha. Aos seus, triste pelo que queria ser... mais feliz.
Até que um dia, aos olhos de todos, a aparência assumiu-se e a tristeza instalou-se.
Nunca ninguém soube por que razão. Mas foi assim que deixou de sorrir.
Sem comentários:
Enviar um comentário