segunda-feira, junho 19, 2006

João Egídio

Terá uns 5 anos, o João Egídio.

Veio para Monte Gordo com o avô, e com a avó a quem chama, muitas vezes, mãe.
O João é um miúdo como os outros: trouxe uma bola, pá e ancinho e um balde para carregar água e areia molhada. Mas o João Egídio é único noutros aspectos: não só tem o nome mais horrível de toda a praia (até ver), como tem uma avó que o grita e repete, por tudo e por nada:

- João Egídio, limpa a boca;
- João Egídio, sai do sol,
- João Egídio, põe aqui a bola...

E ali anda o João (vamos evitar o segundo nome, para protecção da criança) feito gato-sapato, de um lado para o outro. A avó/mãe sempre em cima dele, não o deixa respirar, e a pobre da criança não pode fazer nada. Se quer jogar à bola puxa pelo avô que já se arrasta para andar, quanto mais para bater na bola; se quer jogar raquetes, está sempre vento - na cabeça da avó - e não pode ser que a bola voa; se quer ir à água, 'espera lá que o avô já lá vai contigo. Vens? Não me apetece. Pronto, vou eu, és sempre o mesmo!'

Hoje, avô e neto comeram bolas de Berlim - talvez amanhã escreva sobre o vendedor - e ambos deitavam creme pela boca. 'Não tenho guardanapos', disse a avó. E nem sei como se limparam porque desviei a cara.

O João Egídio tem sorte porque a praia está boa. Tem azar porque veio com as pessoas erradas. Ainda para mais, a grande avó- umas maminhas avantajadíssimas e barriga a apará-las - apanhou um escaldão. Teve de ser a vizinha de chapéu de praia a barrar-lhe um creme nas costas, porque o avô pouco se importou com ela. Aos 70 e tal anos - presumo - umas costas vermelhas parecem ter outra cor qualquer, aos olhos de um cansado marido.

O João Egídio aguenta-se. Não chora. Grita pouco e é um mimo, na obediência. Passa a vida a ouvir os exemplos de uma - o Filipe - que fazia tudo o que aquela mulher mandava.'Ouviste?'

Eu, quando eles enchem a boca de creme, aproveito o silêncio e durmo.
Mas sonho com uma vida melhor para o pequeno João.

4 comentários:

João Oliveira Santos disse...

Se tiverem sorte esses Joões Egídios arranjam asma, que é forma do corpo mostrar aos outros todo o ar que lhe tiram. Depois, quando esses seus avós baterem a pataleca, os Joões Egídios fazem-se à vida, mancos, como sempre foram afinal, de mães que os encaminharam para trás, para as suas, que na altura também não terão sido.

Mas tudo se há-de compor graças a deus e um dia esses Joões Egídios terão 70 anos e hão-de rir baixinho, para dentro das toalhas onde se deitam, na Quarteira ou em Montegordo, em Benidorm ou em Vila Praia de Âncora. Hão-de transbordar de creme das bolas de berlim enquanto as suas patroas escaldam ao sol chamando por netos com nomes ainda mais jeitosos!

Leão da Lezíria disse...

O João Egídeo vai transformar-se num funcionário público obediente e cumpridor. Um dia chegará ao escritório e despejará duas cartucheiras da Kalashnikov nos colegas. O colega sobrevivente dirá ao 24 Horas que ele espumava um creme amarelo pela boca e perguntava porque é que ninguém ía com ele à água...

Anónimo disse...

Há pessoas que nada mais fazem na praia que observar o outros. Já não basta a sina do João Egídio em ter a família que tem, ainda tem que ter uma mirone a ver. Coitada da criança!

João Oliveira Santos disse...

vizinho em robe - Ele até era um fulano normal, nunca o vi ser mal-educado com ninguém, numa ocasião até, com a prima daquele senhor ali, até lhe chamaram filho de uma esta e de uma aquela e o João nada, portanto já vê...
transeunte sem dentes à frente - isso, uma jóia de pessoa é o que á, nem se percebe. Eu ando sempre aqui derivado a um problema que tenho numa perna, quer ver? e nunca lhe conheci isto! Nada. Com uma ak47 não foi? Quem diria! Mas onde é que ele foi buscar a fusca?
vizinha de baixo - Ele nunca me enganou senhores nunca! Todo falinhas mansas, todo lisuras nã, dizia eu, aqui há coisa...


àh leão! da lezíria.