Dias para Recordar
Entrei a medo no confessionário. Tinha andado semanas a preparar-me. A catequista, a Dona Emília, dissera-nos que tínhamos de ir lá e dizer os nossos 'pecados', aquilo que tínhamos feito nos últimos 7 anos, já que foi nessa idade a minha primeira confissão. Segundo ano da catequese, 2ª classe na Escola Primária, e um sem número de erros a recordar para dizer ao Padre. Sei que era psicólogo, o padre, e estava habituado a estas confissões de garotos, receosos dos males do mundo. Sentei-me à frente dele numa cadeira de madeira. Perguntou-me o nome, talvez me tenha perguntado outras coisas, não sei... Ter-lhe-ei dito os meus pecados de enfiada, poucos, provavelmente, num esforço de memória para não ficar mal. Ouviu-me carinhosamente e explicou-me o que fazia eu ali... Para mim era apenas a preparação para o dia em que vestiria o vestido cor-de-rosa, até aos pés, em que poria na cabeça a fita florida a condizer. O mesmo fato que tinha usado para levar as alianças num casamento. Mas havia mais: estava ali para me preparar para comungar. E eu sabia que só as pessoas boas e livres do tal 'pecado' podiam fazê-lo. Diz o Acto de Contricção... 'Meu Deus, porque sois tão bom...' Reza dois Pai-Nossos e uma Avé Maria. Saí sentindo-me uma santa, um daqueles pastorinhos que tinha conhecido num livro e que tinham visto a Nossa Senhora. Os joelhos assentaram trémulos no banco da Igreja e rezei. Quando saí estava feliz. E lembro-me de ter pensado na minha avó. Se ela comungava todos os Domingos, era porque era também Santa, ela sim, uma mulher tão boa, a quem eu não via um só defeito. Disse-lhe isto, quando cheguei a casa. E dois dias depois vesti o vestido e comunguei. Amen. E voltei para o meu lugar.
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