Uma espécie de exéquias
"Como é que eu não hei-de sofrer do coração?", ouço do outro lado da linha como se a expressão ainda se aplicasse neste mundos dos telemóveis. Mas que ficou, ficou. E é assim que do outro lado da linha (da antena?)a conversa vai chegando ao fim. São lamúrias de mãe às quais, tanto quanto o possível, tento manter-me imune. Mas percebo-a. O filho, meu irmão, morreu. E o pior é que ainda está vivo.
A minha mãe não se conforma. Não entende, não admite. Eu ainda admito, talvez por achar que entendo. Vejo-lhe nos olhos todos os fantasmas que também já foram os meus e mais alguns, que lhe entraram alma dentro com a idade e dos quais nunca se livrou. Sem grande luta, tornaram-se residentes. Culpas, tê-las-á. Ausências, certamente.
Sempre que penso nele assusta-me saber que somos da mesma cepa. E tento encontrar aquele momento no tempo que terá ditado a cada um a sua sorte. Uma vírgula no ponto certo da frase, uma pausa mais demorada, um olhar mais lato, um amor mais ponderado. E amigos que fizeram toda a diferença e sem os quais nunca seria quem sou.
O meu irmão morreu? Ainda me custa acreditar... É que não tenho mais nenhum.
1 comentário:
Talvez esteja apenas adormecido. Não desistas dele... mesmo que penses que ele desistiu de ti.
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