sexta-feira, maio 19, 2006

À meia-noite, no Museu




Entrei pela Praça de São Marcos pelos olhos de um Canaletto do século XVIII. Em Veneza olhei para o lado e pude ver-me rodeada de gente a sério. Não era só naquela praça pintada a óleo sobre tela, mas sim numa sala do Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA), em Lisboa, pouco passava das 23 horas. Disse bem: onze da noite.

O Dia Internacional dos Museus tem destas coisas e o MNAA, pela segunda vez, mostra-se até tarde para provar que um museu não tem de ser um espaço de pó e velharias, de histórias inacabadas e cores que escorrem anos que passam. Não. Eu senti-me no centro de um mundo diferente. Àquela hora, eu que decidira ir sozinha à exposição que reúne perto de uma centena de peças da colecção do Doutor Gustav Rau, senti-me no centro da metrópole, e cada um daqueles visitantes parecia falar uma língua diferente. Eram todos portugueses, porém. De todas as idades e, claramente, de várias classes sociais - não digo que não abundavam as mais abastadas, mas essas tinham tantas cores no rosto, como um Monet em toda a tela.

Fiquei feliz naquele ambiente. Não só por ter podido admirar um verdadeiro Canaletto - daqueles que a Sotheby's leiloa a preços que não sei medir - mas também pelos que não conhecia, pelos Monets em fila, pelo El Greco imponente. Sobretudo fiquei feliz porque entrei num museu com vida. Será esse o verdadeideiro impressionismo? A mim impressionou-me e motivou-me a voltar. Eu que até sou mais dada à arte contemporânea gostei de ver as carinhas redondas dos santos, as mãos perfeitas das velhas, as virgens cheias de graça com contornos de mães únicas. Gostei e recomendo.

A colecção foi reunida em 30 anos, mas vê-se em pouco mais de uma hora. Menos, para os que não gostam de fixar-se em pormenores. E depois, o Museu convida a uma visita ao jardim, uma das mais belas vistas da cidade de Lisboa, que esta noite recebia DJs e música eletrónica até às 3 da manhã, mas que em dias normais serve harmoniosos chás e meias de leite ao longo de ensolaradas tardes de arte. Ao natural.

2 comentários:

Leão da Lezíria disse...

Gostava de ter sido eu a escrever este post. Porque significaria que também lá tinha estado, mas, principalmente, porque era sinal que eu escreveria muito bem...

dondoca disse...

Deixei uns smarties na mesa do café.