Message in a bottle
Imagino-a no escuro do quarto. Luzes apagadas. Rosto encostado no vidro frio. Cá em baixo o barulho do metal contra o asfalto sobressalta um gato que dormita perto. É ele que arrasta a lata de tinta com o pé. Molha o pincel no líquido branco e desenha letras de meio metro no negro do alcatrão. É preciso que ela consiga ler à distância de um quinto andar. Lá do alto, onde ele lhe pressente a presença. Como pressentiu durante as horas em que o telefone tocou sem que houvesse resposta. Ela protegida pelo escuro da noite. Também lá estava quando tocou à porta. O barulho da campainha a ressoar nas paredes manchadas pelas luzes dos candeeiros da rua. Da praceta onde ele vai passando de uma letra à seguinte. Tentou de todas as formas. Escreve porque nenhuma outra resultou. Não tem vergonha das pessoas que passam de carro na madrugada amena de um bairro da capital. As letras gritam no negro do alcatrão. Ele arruma o pincel. Fecha a lata de tinta. Senta-se à berma do passeio e espera. As horas passam vazias. Para ele. Para ela. PERDOA-ME.
[alguém escreveu a letras garrafais a palavra 'perdoa-me' na rotunda ao pé de minha casa. Não sei se a história foi assim, eu gostava que fosse, e espero que ela o perdoe. Algo me diz que só um homem poderia fazer uma coisa destas]
1 comentário:
E sem acreditar no que os seus olhos liam, a tipa que agora é mais orgasmos perguntou à sua amiga Esquizo: "Isto aconteceu mesmo?" Era o centro do mundo, e no centro do mundo acontecem as coisas mais estranhas, tem a ver com o magnetismo da terra, mas as coisas extraordinárias não lhe aconteciam só a ela. Estava contente por a sua amiga andar de olhos bem abertos, presa à realidade. Estava muito feliz e iria, depois de escrever sobre um determinado vereador da câmara municipal de Lisboa, fazer a sua versão desta história. Gostou da imagem. Gostou da história contada pela mão da sua amiga.
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