Sessão de Engate I
Vestiu a camisa mais decotada e pô-la por fora dos jeans, desabotoada em baixo, com o umbigo a ver-se ao primeiro movimento. Umas botas de salto modelavam-lhe o rabo e perfumou-se com o Hot, da ralph lauren, um cheiro quente e quase sempre de abrir o apetite. Meteu o telefone no saco, a carteira com a carta de condução e o BI, as chaves do carro e saiu. Não se esqueceu de um casaco novo que quase estava a estrear, porque a noite já se fazia fresca e o Verão tinha acabado de acabar...
Ia encontrar-se com ele pela primeira vez, fora do escritório, fora dos olhares curiosos dos colegas, e dos risinhos delas, das amigas lá do trabalho. Não queria ir nem muito vulgar, nem muito sofisticada. Tinha lido na capa de uma revista que os homens se assustam com uma mulheres demasiado produzidas. Por isso pintou os lábios ao de leve e pôs um rimel discreto que apenas lhe abriu mais os olhos castanhos.
Estava impaciente. Já tinham dito tanto um ao outro, mas só pelo 'messenger', só via computador, só através de mensagens escritas, que isto agora as amizades fazem-se assim, à distância, sem cartas de quatro folhas, mas com 3 ou 4 de linhas e palavras encurtadas numa linguagem de formulário. Olhou para o relógio, um Gucci de pulseira dourada e duas voltas no pulso. Eram nove e vinte. Tinha dez minutos para chegar ao restaurante. Dava tempo. Para isso, e para um 'valdispert', porque estava demasiado apreensiva... O primeiro encontro desde há quatro anos! O primeiro homem desde um ex-marido matreiro, mentiroso e sem escrúpulos. O primeiro passo para uma confiança extra.
Viu logo o carro dele estacionado à porta. Um Audi A3, preto, matrícula qualquer coisa, 'BU'... Ele estava lá dentro a fumar um cigarro, vidro meio aberto, meio fechado, blusão pendurado no assento de trás.
Continuou a andar.
- Boa noite. Vim cedo demais?
Ele abriu a porta e apagou o cigarro. - Nem pensar, respondeu, já estava a sentir a tua falta. - Meu Deus, um primeiro piropo, pensou. Sentiu-se corar. Estava desejosa de falar com ele, de esclarecer tantas coisas que tinham ficado em aberto naquelas conversas surdas, de perceber o porquê daquela atracção, de justificar uma saída à noite pela primeira vez, em tantos meses...
- Entramos? Marquei mesa. - disse ele. E empurrou-a devagar, pelo braço, e ela sentiu-lhe a força dos dedos e arrepiou-se. Ia tropeçando no degrau, mas lá se endireitou e ficou mais descansada quando percebeu que, exactamente nesse momento, ele olhava para trás para trancar o carro.
Deu-lhe passagem para que falasse com o empregado. Sentaram-se numa mesa ao pé da janela e já havia entradas à disposição. Estava esfomeada mas conteve-se e só pegou no pão torrado quando ele fez o mesmo e lhe passou patê em cima. Ela escolheu a manteiga com alho, mas depressa se arrependeu. Trocou discretamente o pacote e começaram a falar do trabalho, dos colegas e de tudo o que podiam ter falado no escritório mas que nunca falaram. Por pudor.
O empregado trouxe o menu.
Pausa na conversa.
Quando retomassem, tinham de tocar no assunto.
4 comentários:
Estas estórias aconteceram assim bonitas? Ou és tu que tens o condão, de as tornares?
São inventadas... Talvez aconteçam a alguém...
Inventadas ou não, eu consegui visualizar tudo!
Tens um Dom... Parabéns
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