sábado, abril 22, 2006

[my] Gift

Encontrei-te hoje à porta do Coliseu. Franzi o sobrolho. Levei a mão à base do pescoço, como faço sempre que fico ansiosa. Acelerei o passo para que percebesses que não queria falar contigo, para que visses que estava acompanhada. Mas ambos sabíamos que não haveria altura mais apropriada para voltares. Seguiste-me de perto. Tão perto que sentia o teu hálito quente no meu pescoço, enquanto trauteavas os primeiros acordes da música que partilhamos no meu tapete vermelho quando voltaste pela primeira vez. Naqueles dias de distância, fomos separados comprar o AM-FM só por causa daquela música. Olhei-te de novo, num último apelo para que me deixasses. Mas acho que também querias ouvir, como ouvimos, lado a lado, a primeira música da aula magna. Chegamos tarde, lembras-te? As conversas eram, nessa altura, como as cerejas. Perdíamos facilmente a noção do tempo. Lembras-te quando o mundo parava para nós? Lembrei-me disso tudo. Daquela noite. Do jantar. Do concerto. Do teu medo, lembrei-me principalmente do teu medo. Até que a Sónia começou a cantar, lentamente, como devem ser vividos os grandes amores. It’s coming back so fast, that I should fake this alone. Esperei que chegassem as lágrimas. Só que desta vez elas faltaram ao encontro. De alguma coisa me havia de valer ter lágrimas de má qualidade. Esperei até entrar o refrão e nada. Esta noite elas, as lágrimas, entraram em greve. Senti que te afastavas. A última vez que te vi estavas sentado junto ao palco. Ouvias a música, que nunca voltaremos a partilhar, com muita atenção. Talvez confirmasses, mais uma vez, que o poeta se enganou. Because even if you break my heart and even if you make things wrong, you will always be the one, you will always be my love. Sorri e deixei-te entrar na caixinha verde alface, onde dormes agora o sono dos justos. Encontrei-te hoje à porta do Coliseu e pela primeira vez não vieste comigo para casa.

3 comentários:

Madame Pirulitos disse...

O desassossego angustiante da ausência, entrelaçado com a surpresa da serenidade a chegar. O presente que nos é dado pode ser apenas perceber a importância de viver o presente, redefinindo o passado.

Gostei bastante.

Catarina disse...

Fizeste-me chorar.
[estúpida...]
Sei que na quarta-feira te verei de branco. Ainda bem.

Carrie disse...

Fiz? Porque?