domingo, agosto 27, 2006

12 anos de um mesmo dia

Ao terceiro ano tudo devia ter passado, mas ela estava presa a um outro tempo e não conseguia distinguir o bom do mau. Tudo era bom, sendo mau, e tudo era bom porque até o mau era bom. Com a cabeça tão confusa e a mente tão desligada do futuro restava-lhe pensar e fazer contas à espera que o tempo passasse. Dá tempo, ao termpo, disseram-lhe. E ela deu. Tanto que o tempo a tomou e cada data tinha qualquer coisa para recordar.

Era uma vida de coincidências, a dela. O início do namoro e o fim do casamaneto tinham sido precisamente no mesmo dia. 12 anos separavam as datas, mas o dia e o mês coincidiam. Quando pensava no beijo a que disse sim, pensava imediatamente nas lágrimas de um não para o resto da vida. Seria? Ela não sabia. Tinha acontecido tanta coisa e ele não era uma pessoa definitiva. Ela é que devia ser, mas não conseguia.

Recordava com a mesma força o dia em que viram as estrelas juntos, com a água da barragem a luzir com uma lua cheia, maravilhosa. As mãos entrelaçadas ainda envergonhadas. Os olhos curiosos dos amigos que queriam ter a certeza que 'desta vez' era a sério. É que, à semelhança de fins, também houve muitos inícios. Aquele era apenas o oficial. Beijou-a ternamente naquela noite suave e sem vento, e a partir daí deciddiram ser felizes. Ao mesmo tempo, recordava esse mesmo dia, 13 anos passados, feitos de sortes e azares, lágrimas a saltar como nunca, ele a passar-lhe um braço por cima, o telefone a tocar insistentemente e ele, mesmo de férias, que era Agosto, a atender as chamadas. Falava italiano e ela percebia que nesse dia ele partiria. Acabaria as férias ali mesmo, o casamento, ali mesmo, o amor saía para Itália para ter uma pronúncia diferente e um gosto carregado a parmesão. E ela até gostava de queijo. Mas não naquele dia de Agosto.

Era um dia de Agosto diferente dos outros. Era possível recuar cada ano e saber como tinham, noutros tempos, celebrado aquele dia. Nunca mais aconteceria. Era um dia de Agosto como os outros. Mas triste.

Encostou-se às paredes de pedra da velha Estrada de Sintra e pediu, implorou, deu alternativas, prometeu. O italiano irredutível apenas lhe passava a mão pela cabeça. Ela gritava. Ele pedia-lhe baixinho que se calasse, que era melhor para os dois, que assim é que tinha de ser e que, um dia, chegariam ambos a essa conclusão. Ela não sabia que era possível concluir isso.

Ela ainda não sabe. E Agosto está a chegar ao fim.

Sem comentários: